PixUSC: manifestações fascistas e homofóbicas são encontradas nas portas de banheiros

Entre os envolvidos, saiba o que grupo Direita Bauru tem a dizer, o que pensam os estudantes e quais as providências tomadas pela prefeitura do campus

 Reportagem publicada em 4 de abril de 2018 

“Cura gay = surra de paulada”, assinada por Direita Bauru; os símbolos são sigmas que representam o integralismo, versão brasileira do fascismo italiano (Foto: Não Empata Meu Rolê/Reprodução)
Por Bibiana Garrido

As pixações chegaram ao conhecimento da administração na quarta-feira (28), finalzinho de março, véspera de feriado. Luciana Galhardo, que trabalha no setor de Comunicação da USC, me explica que por ser uma instituição católica a Universidade do Sagrado Coração fecha um dia antes da Paixão de Cristo.

“Mesmo assim a prefeitura contratou uma equipe para fazer a limpeza e a pintura das portas”, relata Luciana. “De forma alguma a gente pode permitir isso dentro da universidade”.

De cunho fascista e homofóbico, as mensagens foram encontradas em banheiros masculinos entre o final de 2017 e o começo de 2018. Em postagens na página Não Empata Meu Rolê, foram tornadas públicas de uma vez só.

Em outubro do ano passado foi descoberto o primeiro pixo: “Mate um favelado, mate um anarquista”. No mês de março desse ano, mensagens sobre cura gay: “Remédio gay é lâmpada fluorescente”.

As três ocorrências foram assinadas. Direita Bauru é um grupo formado a partir dos protestos contra a corrupção em 2013. Permaneceu na ativa até 2015, como afirma o ex-integrante Gabriel Moutinho, ano em que o grupo reuniu milhares de pessoas a favor do impeachment de Dilma Rousseff na Av. Getúlio Vargas.

“Tinha o pessoal da intervenção [militar], os monarquistas, mas a maior parte era liberal”, comenta Paulo Ladeira, que também participou dos protestos com o Direita Bauru. Na época, a ideia era unir os interesses em comum para alcançar o objetivo da manifestação. Ladeira é filiado ao PTB e já foi candidato a vereador na cidade. Moutinho, formado em História pela USC, faz parte da Juventude do PSDB, braço que conta com a participação de 53 jovens de Bauru e região. Atua também na corrente Ação Popular do partido: “é um movimento de centro-esquerda dentro do PSDB”, explica. Os dois me encontraram na escadaria da universidade para falar da ligação do grupo com os pixos.

“Deixei o grupo em 2015, não falo pelo grupo e não participo mais desde a queda de Dilma Rousseff, que, por acaso, era a única proposta concreta”, conta Moutinho. Quando ficou sabendo do que estava acontecendo na USC e da autoria atribuída ao Direita Bauru, entrou em contato com outros ex-membros do grupo para retirar a página do ar.

“Se tem alguém usa esse tipo de grupo pra vandalizar, que tem esse tipo de iniciativa, tá completamente errado”, se posiciona Moutinho. “A cultura do ódio não tem que se manifestar, é uma idiotice em qualquer lugar, em qualquer momento”.

Para Moutinho e Ladeira, quem rabiscou as portas e paredes dos banheiros estava forjando a identidade em uma tentativa de “ferir a imagem do grupo”.

Não há previsão de investigação para buscar responsáveis pelas pixações. Raquel Cassoli é orientadora de estágio do curso de Psicologia e detalha que “o estatuto da USC prevê punições que podem incluir a suspensão do aluno, caso seja constatado que foi feito por um estudante da mesma”. A possibilidade de ser alguém de fora não é descartada por Luciana: “como o campus é aberto, a gente não tem como saber da onde veio”.

À esquerda, já meio apagada, “Remédio gay é lâmpada fluorescente”; à direita, “Mate um favelado, mate um anarquista”, com referência ao Direita Bauru (Fotos: Não Empata Meu Rolê/Reprodução)

Para R.L., estudante que preferiu não se identificar, a universidade não tem interesse em aprofundar a questão. “A USC não falou nada. Por que vai querer dar atenção pra isso? Aqui não é a Unesp, onde qualquer coisa que acontece é oportunidade da gente debater o assunto”, relembra, em menção a caso semelhante ocorrido no campus da Unesp em Bauru. “A USC é particular e não quer queimar a instituição com esse tipo de polêmica”.

De acordo com o setor de Comunicação da USC, são 7.500 alunos frequentando a universidade, 20% deles bolsistas.

A diversidade não parece presente para M.B., estudante que também quis preservar sua imagem. “É a manifestação de uma série de discursos que existem na universidade, com um viés fascista, de ódio, contra grupos minoritários que estão expostos a fragilidades sociais. Me senti com medo de ver isso aqui”, desabafa. “Apesar de ficar decepcionada, não fiquei muito surpresa. Esse tipo de pensamento tá aí e as pessoas acabam reproduzindo, às vezes sem entender o que elas estão fazendo”.

“Eu não vejo uma variedade de pessoas aqui na USC. Predominantemente são pessoas de classe média-alta. Você não vê diversidade, não vê uma discussão que paute a diversidade. Se a gente for conversar com os alunos, a gente vai perceber que existe um pensamento predominante que não consegue enxergar o outro. As pessoas aqui se enxergam a partir delas: um pensamento branco, de classe média-alta mesmo.” — M.B., estudante.

A ausência de um movimento estudantil atuante também contribui para que o preconceito marcado nas pixações permaneça assunto de conversas de corredores. É o que diz R.L., quando conversamos sobre centros e diretórios acadêmicos que poderiam organizar e mobilizar estudantes para a discussão.

Para tentar reverter o quadro, estudantes de cursos como Psicologia, História, Biologia, Química, encaminharam documentos reivindicando atitude por parte dos docentes e da administração. “Não houve posicionamento da universidade. A gente tem cobrado, alguns alunos têm se mobilizado. O pessoal ficou estremecido com o que aconteceu”, diz M.B.

A orientadora Raquel afirma que tentou “acolher a preocupação dos alunos e direcioná-los para ações não apenas de caráter micro [na USC], mas também de caráter macro”. Acredita ser importante investigar se manifestações como essas estão acontecendo em outros lugares de Bauru.


Errata: Texto foi corrigido às 17h32 de 04/04. Paulo Ladeira é filiado ao PTB e não ao PDT, como estava escrito.