Para que(m) são os direitos humanos?
Conheça o Plano Municipal de Direitos Humanos de Bauru, e para quê ele serve
Reportagem originalmente publicada em 15 de dezembro de 2017
Por Lucas Mendes
“Bandido bom é bandido morto” ou “direitos dos manos” são exemplos de como o assunto sobre os direitos humanos geram conflitos e desentendimentos, mesmo nos dias de hoje.
Buscando discutir os direitos humanos e o papel do poder público, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) promoveu uma audiência pública na Câmara Municipal de Bauru, no dia 8 de dezembro.
Aberta para a população, a reunião recolheu propostas para a revisão do Plano Estadual de Direitos Humanos, um documento com mais de 20 anos de existência que passará agora por uma revisão. Nessa audiência participaram representantes de sindicatos, militantes dos direitos humanos, funcionários públicos, pesquisadores e profissionais da área da saúde.
Ponto de destaque da reunião foi a proposta de incluir no plano estadual um capítulo exclusivo para tratar da Saúde Mental. A sugestão vem carregada de simbolismo, uma vez que Bauru tem importância nacional na campanha da Luta Antimanicomial — o movimento de transformação e humanização dos serviços psiquiátricos.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), os direitos humanos são os direitos que pertencem a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição.
Eles incluem o direito à vida e à liberdade, à liberdade de opinião e de expressão, o direito ao trabalho e à educação, entre muitos outros.
Para orientar a defesa desse direitos, a ONU adotou em 1948 um documento oficial: a Declaração Universal dos Direitos Humanos, valendo para todos os países.
A cidade de Bauru também tem um documento desse tipo. Trata-se do Plano Municipal de Direitos Humanos, feito em 2010 e revisado em 2016. “Por mais ideológico que sejam os direitos humanos, não dá pra diferenciar. Se um cara tá passando fome não interessa se é PT, PSDB, ele tá passando fome”, explica Clodoaldo Meneguello Cardoso, presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos de Bauru, e responsável pela revisão do plano.
“A metodologia de dar o prato de comida pode ser mais de direita ou mais de esquerda”, diz ele.O plano de Bauru foi elaborado em 2010 e revisado em 2016
Confira a seguir uma entrevista exclusiva que Clodoaldo Cardoso concedeu ao Jornal Dois:
Pra quê serve esse Plano Municipal de Direitos Humanos?
O plano seria um elemento facilitador da organização. Seria uma orientação, até porque a vida é muito mais dinâmica do que um plano. Mas essa sistematização é importante.
Os direitos humanos são uma luta do oprimido. Embora sejam direitos humanos para todos, eles são uma luta do oprimido. Porque o opressor já tem seus direitos garantidos.
Então quando falam que “direitos humanos é pra bandido”, é pra bandido sim. É pra bandido pobre, porque o bandido rico já tem. Nós estamos numa sociedade que não tem visão do todo. Não tem a visão do coletivo e ao mesmo tempo toda demanda coletiva é jogada para o poder público.
Como começou esse processo de elaborar um plano?
Teve um momento em 2010, que quem coordenou esse processo de elaboração foi a comissão de direitos humanos da Câmara Municipal, recém instalada e com a presidência do Roque [Ferreira (PSOL), ex-vereador], além dos movimentos sociais organizados na época, e foi trabalhado nesse plano.
Porém ele não chegou a ter uma versão final e oficial. Ele ficou “meio oficial, meio engavetado”, e quando assumi a presidência do Conselho Municipal de Direitos Humanos em 2016 resolvi retomar esse processo, revisando e ampliando. E oficializamos isso ano passado, com lançamento no dia 1º de agosto.
Mas é sempre preciso revisar. Algumas questões podem ganhar força específica ao longo do tempo. Nesse plano atual, por exemplo, tem um capítulo sobre discriminação, mas envolvendo todo tipo de discriminação. Nesse caso, a questão do negro merece um destaque pelas características do Brasil e locais.
A ideia é sempre como colocar esse plano na agenda de discussão dos movimentos sociais. É isso que estamos estudando.
E como fazer as pessoas se apropriarem desse conhecimento, e passarem a exigir esses direitos?
Uma das ideias é fazer alguns encontros com movimentos sociais, em que haveria além da discussão um pouco de formação política a partir da temática dos direitos humanos. Isso tudo mediado pelo Conselho Municipal de Direitos Humanos.
Mas essa é apenas uma das maneiras. Esse plano poderia estar muito mais amplo se não fosse a questão da mídia. Tudo é bloqueado.
Por enquanto estamos pensando em conseguir através da Prefeitura uma coluna no Jornal da Cidade, para os conselhos municipais. Mas estamos naquela fase de amadurecimento dessa ideia e criação de uma metodologia para isso.
Falta conhecimento?
Sim, falta bastante. Uma outra coisa que falta é nas escolas. Já poderia ter um esquema de debates direitos humanos, mas a barreira está na Diretoria de Ensino.
Primeiro que o estado não tem um plano estadual de direitos humanos. O que se tem é um documento de 20 anos atrás que nós estamos tentando mudar.
Segundo que foi esse ano de 2017 que o estado começou a elaborar e vai soltar agora o plano de educação em direitos humanos. Não se tinha isso. A cidade de São Paulo, por exemplo, tem o seu plano municipal de educação em direitos humanos. Bauru também não tem um plano desses. E pra você ter uma ideia, hoje o único projeto permanente dentro da Secretaria de Educação de Bauru é o Núcleo de Educação em Direitos Humanos, que eu estou tocando voluntariamente há 9 anos.
Falando em educação, em qual idade é melhor começar a tratar desse assunto?
Aqui em Bauru nós criamos uma metodologia de trabalhar direitos humanos com crianças de dois a seis anos de idade. E já dá pra trabalhar com essa idade. No Brasil não tem essa experiência, e isso foi pensado aqui.
É importante trabalhar esses temas nessa idade. A criança ali vai sedimentar uma visão de mundo. Nós partimos do princípio de que ou ela vai ter uma visão de mundo plural ou unificada. A educação tradicional e a nossa cultura branca ocidental tem um parâmetro de universalidade. E quando você universaliza, você unifica.
A ideia primeira é a questão da diversidade. Cada idade tem uma prática que vai ampliar a percepção da diversidade.
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