Da Esquerda a Direita II: Política no Brasil
Da Colonização ao Império
Coluna publicada em 27 de janeiro de 2018
Por Arthur Castro, colunista do JORNAL DOIS
A ideia de que o Brasil foi descoberto acidentalmente por Pedro Álvares Cabral é popular, mas falsa. Alguns anos antes, Cristóvão Colombo — esse sim por acidente — chegou ao continente americano e informou ao Império espanhol.
A Espanha era uma das maiores forças mundiais, junto com Portugal. Os dois Impérios, sabendo que existia essas novas terras da América, fizeram um acordo: cada um iria ficar com um pedaço. Era o Tratado de Tordesilhas. Em 1500, os portugueses vieram aqui para dizer “essa é a nossa parte”.
Com o tempo, tanto as terras portuguesas quanto espanhóis passaram a ser dominadas por grandes fazendeiros, os latifundiários. Muitos deles, membros da nobreza — aquela nobreza que expliquei no texto anterior. Essa elite, apoiada pelos reis europeus, destruía os povos indígenas locais e escravizava as populações africanas. Muitos anos depois — alguns séculos na verdade — esses poderosos locais vão cansar de obedecer aos poderosos da Europa e vão articular a independência.
O Brasil viria a se tornar, então, uma Monarquia: vamos ter o nosso próprio rei. E então a briga que ocorria na Europa vai chegar aqui também.
As antigas elites — ligadas à nobreza — vão se organizar em torno do PARTIDO CONSERVADOR, que defende o Rei e a Igreja Católica. A nova elite burguesa — comerciantes, principalmente das cidades — vai criar o PARTIDO LIBERAL. Os Conservadores vão ser fortes entre os fazendeiros donos de escravizados, os Liberais, entre os endinheirados urbanos.
Uma curiosidade é que, posteriormente, os defensores do Conservadorismo vão ter um jornal próprio, o Estado de São Paulo, conhecido como Estadão, enquanto os grupos liberais vão fundar a Folha de São Paulo.
Quando o Rei acaba caindo e nos tornamos uma República, ambos os partidos se fundem, dando origem aos partidos republicanos, de ideologia conservadora-liberal.
É importante mencionar que durante todo esse tempo houveram resistências populares — principalmente de povos indígenas e afrodescendentes — aos senhores da elite. Ressalta-se o Quilombo dos Palmares bem como revoltas diversas, por exemplo, a Balaiada.
Fazendeiros e Fascismo
Os dois principais Partidos eram o Partido Republicano Paulista (PRP) e o Partido Republicano Mineiro (PRM). Ambos fizeram um acordo: cada um elege um presidente por vez. Como as elites paulistas eram produtoras de café, e as mineiras, de leite, a aliança foi chamada de REPÚBLICA DO CAFÉ COM LEITE.
À parte das forças conservadoras-liberais, começa a se desenvolver as organizações de trabalhadores assalariados para resistir ao novo modelo capitalista, que substituía a escravidão.
Os latifundiários, com uma estratégia racista, decidem “clarear” o brasileiro, promovendo imigração de europeus pobres, principalmente da Itália. O que não esperavam é que muitos eram anarquistas.
O Anarquismo, Socialismo de extrema-esquerda, começa a se espalhar entre a população pobre brasileira, tendo lideranças negras, como o operário Domingos Passos. Cresce assim, no Brasil, o Sindicalismo Revolucionário, sob influências de anarquistas. Em 1917, uma greve geral para São Paulo e no ano seguinte, uma insurreição quase toma o Rio de Janeiro.
Nessa época, na Europa, ocorria a Revolução Russa. A vitória do marxismo, na figura do Partido Bolchevique, começa a mudar as coisas. Com a União Soviética e as adaptações ideológicas adicionadas por Lênin, os marxistas passam a ganhar influência no resto do mundo, incluindo no Brasil.
A extrema-direita começa a se organizar em torno de uma ideologia inspirada no Fascismo e do Fundamentalismo Católico, o Integralismo. Esquerda e direita se enfrentam nas ruas, a tiros.
Na década de 30, Getúlio Vargas assume o poder e, falando do risco de uma ameaça comunista, dá um golpe e implanta o Estado Novo, de influência fascista. Uma de suas estratégias é vincular os sindicatos ao aparato do Estado, burocratizando-o e enfraquecendo a luta socialista. Isso combinado a repressão, esmaga o Anarquismo brasileiro. O Marxismo, organizado em torno do Partido Comunista Brasileiro (PCB), passa a ganhar força como oposição de esquerda, liderado por Luís Carlos Prestes.
Surge a União Nacional dos Estudantes, a UNE, dando um gás ao movimento estudantil.
Ditadura Militar
Quando a ditadura de Vargas cai, quem assume a liderança da direita é a União Democrática Nacional (UDN), representante das elites conservadoras-liberais.
O centro é ocupado pelo Trabalhismo, organizado por um Getúlio Vargas “mais democrático” e ligado aos sindicatos. Nos anos 50, um novo governo Vargas é derrubado por um golpe articulado pela UDN e comandado pelo jornalista Carlos Lacerda.
Quem assume a frente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), é João Goulart e Leonel Brizola, de centro-esquerda.
Em 1964, diante de medidas moderadas de reformas populares de Goulart, como reforma agrária (distribuição de terras aos pobres) e limites ao lucro de empresas estrangeiras, as forças conservadoras-liberais, da direita, financiadas pelo imperialismo norte-americano, dão um golpe militar e implantam uma ditadura. Movimentos sociais são reprimidos, pessoas são mortas e torturadas, a UNE é colocada na ilegalidade.
Agora só existem dois partidos: o governo de direita em torno da Aliança Renovadora Nacional (ARENA), e a oposição de centro-direita, centro e esquerda, no Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
Uma Frente Ampla para se opor a ditadura é formada por Carlos Lacerda (direita), Juscelino Kubitschek (centro direita) e João Goulart (centro esquerda), mas os três morrem misteriosamente um ano depois.
Os Marxistas se dividem em duas forças: o Partido Comunista Brasileiro (PCB), alinhado à União Soviética, defendia uma oposição moderada com atuação junto a movimentos sociais e sindicatos; e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que defende luta armada, ligado à China.
Surge um setor católico de esquerda, a Teologia da Libertação. Dão origem às pastorais católicas e às comunidades eclesiais de base.
A ditadura militar começa a pegar empréstimo estrangeiro, fazendo o Brasil ficar endividado. Com o dinheiro emprestado, o Governo começa a desenvolver as regiões urbanas e indústrias, fazendo o país “crescer”.
A tecnologia nas fazendas faz com que trabalhadores sejam demitidos, pois os latifundiários podem produzir mais com menos gente trabalhando. Isso gera um êxodo rural, ou seja, a população do interior e do campo vai para as cidades. Quem fica no campo, fica sem onde trabalhar, o que começa a luta dos sem terra, exigindo um pedaço de chão para produzir. O crescimento das cidades fazem surgir favelas e periferias, e inicia o movimento sem teto.
Nos anos 80, uma onda de greves operárias, em especial no ABC paulista, ganha força. Nesse mesmo período, a ditadura cai e começa a redemocratização.
Democracia para quem?
As lideranças sindicais fundam com estudantes de esquerda o Partido dos Trabalhadores (PT). No meio sindical surge a Central Única dos Trabalhadores (CUT); a UNE volta a existir. Nascem também o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O PT, composto por socialdemocratas, trabalhistas e marxistas, é o centro de todos esses movimentos, e está sob a liderança de Luis Inácio Lula da Silva.
Com o tempo, atitudes moderadas do PT criam rompimentos internos, e daí surgem outros partidos: Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), formado por socialdemocratas, marxistas e socialistas diversos; e os Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU) e Partido da Causa Operária (PCO), ambos marxistas de orientação trotskista.
O antigo PCB abandona o comunismo e se torna o Partido Popular Socialista (PPS), hoje alinhado ao liberalismo. O PCdoB abandona a luta armada e defende alianças com o PT; sua juventude assume o controle da UNE. Mais recentemente um novo PCB surge, com o discurso original de Revolução Social.
Os Trabalhistas recriam o PTB; como o partido começa a se alinhar às antigas elites conservadoras e liberais, um racha interno ocorre e a ala socialdemocrata funda o Partido Democrático Trabalhista (PDT).
O Anarquismo, enfraquecido e dividido entre várias pequenas organizações, volta a crescer nos anos 90. Hoje, a maior organização a nível nacional é a Coordenação Anarquista Brasileira (CAB).
O MDB se transforma no PMDB, de centro. Posteriormente, uma divisão liderada por Fernando Henrique Cardoso leva a criação do Partido da SocialDemocracia Brasileira (PSDB), de centro-esquerda. Com o tempo, no entanto, ambos os partidos começam a caminhar para a centro-direita.
A ditadura acabou, mas as velhas elites continuam no poder. O ARENA se divide: um setor, inicialmente comandado pelo José Sarney (depois foi para o PMDB) se torna o Partido da Frente Liberal (PFL), hoje Democratas (DEM); outra parte da origem ao Partido Progressista (PP), ligado ao Paulo Maluf.
Um nacionalista de direita, simpatizante do Integralismo, conhecido como Enéas Carneiro, funda o Partido da Reedificação da Ordem Nacional (PRONA). Depois, seu partido se funde ao Partido Liberal (PL, centro-direita) e da origem ao Partido da República (PR).
Vários outros partidos, quase todos de centro e direita, vão surgindo para negociar alianças com as elites brasileiras. São os chamados “partidos de aluguel”.
Na extrema-direita, destaca-se o Partido da Renovação Trabalhista Brasileira (PRTB), de Levy Fidelix, com conexões com o Integralismo. As organizações integralistas seguem fracas; algumas são ligadas aos grupos skinheads de direita, os Carecas. Há também outros setores conservadores radicais e populistas, ligados à Jair Bolsonaro, Olavo de Carvalho e Movimento Brasil Livre (MBL).
Nasce no Brasil, também no campo da direita, duas novas forças importadas do exterior, mas ainda minoritárias: o ultraliberalismo (libertarianismo), inspirado no Partido Libertário norte-americano, aqui organizado em torno do LIVRES; e os Eurasianos (ou Nacional Bolcheviques), influenciados por um novo fascismo russo e ligados à extrema direita europeia.
É importante observar que as elites que governam o Brasil desde a origem CONTINUAM no poder. Nunca tivemos uma Revolução que as derrubasse. As principais bases do seu poder hoje são a Bancada da Bala (militares e policiais), a Bancada Ruralista (fazendeiros) e a Bancada Religiosa (líderes católicos e evangélicos).
Hoje critica-se que os partidos de centro-esquerda, como o próprio PT, optaram por se aliar e fazer acordos com as forças conservadoras e liberais. À oposição de esquerda, no entanto, fica a autocrítica do porquê não conseguiu ainda crescer como no passado. Talvez em breve vejamos uma mudança.
No próximo texto, vou abordar Esquerda e Direita a nível mundial, suas divisões e principais acontecimentos.
As colunas são um espaço de opinião. As posições e argumentos expressas neste espaço não necessariamente refletem o ponto de vista do JORNAL DOIS.
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