Como Bauru colocou as discussões sobre mulheres negras em pauta
Evento em comemoração ao 25 de julho reuniu de 70 pessoas
Reportagem publicada em 27 de julho de 2018
Por Ana Carolina Moraes
“No momento em que o Brasil atravessa uma grave crise política e econômica, com o desmantelamento de políticas públicas duramente conquistadas e desmandos por parte de governos elitistas e conservadores, nós negras de São Paulo voltamos às ruas. Celebramos o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e o Dia Nacional Tereza de Benguela, marcos da luta das mulheres negras em todo o Brasil e no Continente.”
O debate Mulher Negra Heroína, organizado pelo Conselho Municipal da Comunidade Negra de Bauru, começou com a leitura do Manifesto: Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, redigido por coletivo Marcha das Mulheres Negras de São Paulo.
Patrícia Alves, pesquisadora do Núcleo Negro Unesp para Pesquisa e Extensão (NUPE) foi quem fez a leitura do na abertura do evento. Ela foi mediadora da mesa, que convidou a Sebastiana de Fátima Gomes, a Professora “Tiana”, e Maíra Marcela Ramos, estudante de educação física da UNESP.
O evento aconteceu na noite dessa quarta-feira no Teatro Municipal, e abordou os desafios e as reivindicações das mulheres negras, em um ato contra o racismo, o machismo, a transfobia e outras formas de violações dos direitos humanos e dos corpos negros.
“Eu falo”
Para Greice Luiz, Presidente do Conselho Municipal da Comunidade Negra, a importância deste evento é fortalecer a identidade e cultura negra em Bauru. O debate faz parte da Semana Afro-Bauruense, que já faz parte do calendário de atividades do Conselho. “Esse é o espaço para a gente refletir sobre o que nossas ancestrais passaram e a gente ainda permanece sofrendo; aqui a gente troca informações, conhecimento e a gente nunca saí da forma como a gente entrou”, comenta.
“Nossa intenção não era esgotar o assunto, mas marcar porque é um debate presente na nossa realidade, uma preocupação do Conselho, e nós estávamos preocupadas em estar também fazendo parte desse debate nacional”, explicou Patrícia Alves, pesquisadora e mediadora do debate.
Durante a explanação, a Professora Sebastiana de Fátima Gomes comentou sobre as consequências do racismo no dia-a-dia das mulheres negras; ela destacou as preocupações das mães em relação aos filhos, que desde cedo sofrem com atitudes racistas. Maíra Marcela Ramos, universitária, comentou sobre a representação das mulheres negras ao longo da história, enfatizando a exclusão nos espaços sociais.
Da fala das convidadas a participação do público, o evento seguiu como um lugar de acolhimento de relatos pessoais sobre do racismo.
Com o microfone em mãos, Agnes Gamberini, militante, comentou sobre representatividade. Ela afirmou que sua presença e a manifestação de seus pensamentos não são esperadas: “vocês podem não ter contato com mulheres trans, com mulheres negras trans, mas eu falo”, declarou. Em outro momento, a fala de Stefany Gonçalves relatou como as dificuldades de reconhecer como negra afetou suas relações pessoais.
Depois do diálogo, o grupo Ouro D’Mina se apresentou, encerrando as atividades. Antes de mandarem os raps, Amanda Ingrid, rapper do grupo, ressaltou que as demandas das mulheres negras “cabem em um ano de atividade”.
Dia da Mulher Negra
A atividade reuniu cerca de 70 pessoas e acompanhou a Agenda Nacional do Movimento de Mulheres Negras, em comemoração ao 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela.
“Foi um dia muito importante para Bauru, porque coloca essas ações das mulheres negras que aqui batalham, que aqui protagonizam as atividades. Elas puderam participar do debate e colocaram as suas ações de enfrentamento e conquista nas suas realidades diversas”, diz Patrícia sobre suas considerações sobre o evento.
Desde 2014, o dia 25 de julho foi instituído nacionalmente como o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra pela Lei Nº 12.987, assinada pela presidente Dilma Rousseff. A data faz alusão a Tereza de Benguela, líder quilombola que viveu durante o século XVIII, comandou a resistência da comunidade negra e indígena por duas décadas, até ser aprisionada e morta.
Já a comemoração ao Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha surgiu em 1992, durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, realizado na República Dominicana.
As duas datas fortalecem o cenário de resistência das mulheres negras, e ganharam enfâse com a Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, realizada também no dia 25 de julho, na Praça Roosevelt. “A leitura do manifesta nos coloca em consonância com o coletivo de Mulher Negras de São Paulo, que marchou pelo 25 de julho, movimentou e que nacionalmente estava falando sobre a importância do protagonismo da mulher negra em suas lutas e conquistas”, comentou a pesquisadora Patrícia Alves.
“Nós somos a base da sociedade, suportamos toda essa estrutura, [e esse evento] foi muito importante para cada mulher pegar o microfone e falar sobre a sua história, a suas vivências, ideias. Foi um momento muito rico, precisamos mais eventos assim”, contou Greice Luiz, presidente do Conselho.
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