A segunda geração dos Ranieri no poder

Com um mandato marcado por rupturas e críticas ao Executivo, Chiara mudou de situação para oposição ao governo Gazzetta em menos de 6 meses de gestão

Publicado em 25 de outubro de 2020

O primeiro mandato de Chiara no Legislativo foi na 30º legislativa, quando foi única mulher da gestão (Ilustração: Laura Poli | Foto do vereador: Pedro Romualdo)
Por  Natália Santos

O sobrenome não deixa enganar. Chiara é filha de Dudu Ranieri, político bauruense e fundador da Faculdades Integradas de Bauru (FIB). No nome da vereadora, que também atua como diretora acadêmica da universidade, estão registrados 25% das ações da instituição educacional.

Em 2016, eleita com 2.544 votos, Chiara passou a ocupar uma cadeira na Casa de Leis, pelo Democratas (DEM). A vereadora iniciou a gestão como líder do governo de Clodoaldo Gazzetta (PSDB) e determinou a fiscalização das contas públicas e do trabalho do Executivo como seus principais focos no mandato.  

Chiara volta para a corrida eleitoral de 2020, em busca de uma reeleição pelo DEM.

‘Inspetora’

Chiara utilizou o recurso das audiências públicas para tratar de assuntos referentes ao trabalho do prefeito e das secretarias. Órgãos municipais também foram foco de vigilância da vereadora, que convocou uma audiência de prestação de contas dos serviços prestados pela Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural de Bauru (EMDURB), junto à Prefeitura, durante os anos de 2017 e 2018.  

O DAE (Departamento de Água e Esgoto) também não escapou. No início de 2020, Chiara foi responsável por levantar o debate sobre a preservação do Rio Batalha, manancial superficial responsável por abastecer cerca de 38% da população bauruense. Em audiência, a vereadora criticou a ausência de ações do poder público municipal visando melhorias de recuperação das matas ciliares, essenciais no processo de regeneração da bacia hidrográfica. O debate sobre a crise hídrica em Bauru não é novo. Sete meses depois do encontro, Rio Batalha atingiu o nível mais baixo do ano e um rodízio de abastecimento de água foi iniciado nos bairros abastecidos pelo rio.

A vereadora esteve no grupo de trabalho de duas Comissões Especiais de Inquérito (CEIs): a dos Precatórios, que apurou irregularidades envolvendo dívidas milionárias referentes a duas áreas de conservação ambiental,  e da ETE (Estação de Tratamento de Esgoto), que investigou possíveis irregularidades relacionadas à obra de tratamento de esgoto.

Ramificações do trabalho

Com Telma Gobbi (PP), Chiara convocou uma audiência a pedido do Movimento Resiste Mulher para discutir a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 181/15), que criminaliza o aborto no Brasil. De acordo com o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), Bauru foi a primeira cidade do interior de São Paulo a sediar uma audiência pública sobre o tema. Nenhuma moção de repúdio à PEC foi proposta.

A vereadora foi autora do PL 232/2019, que estabeleceu a criação do Programa Parada Segura. O projeto permite que os ônibus do transporte coletivo urbano desembarquem pessoas do sexo feminino, idosos ou pessoas com mobilidade reduzida em qualquer local onde seja permitido estacionamento, no trajeto regular da respectiva linha. A medida só vale para o período noturno, visando reduzir o risco de assaltos e violência contra essas pessoas na cidade.

O setor educacional também recebeu os olhares da vereadora. Chiara foi presidente da comissão de Educação e Assistência Social e incentivou discussões sobre a assistência à saúde dos estudantes da educação especial de Bauru. Por meio do recurso de requerimento, ela exigiu informações ao poder Executivo, em relação a reformas de escolas, número de matrículas e esclarecimentos sobre as verbas permanentes e transitórias referente às atividades educacionais.

A vereadora também foi presidente de outras três comissões permanentes da Casa: Ciência e Tecnologia, Interpartidária e Economia, Finanças e Orçamento, de  contribuir com o trabalho de outras duas: de Indústria, Comércio, Agricultura e Abastecimento e de Ética e Decoro Parlamentar.

Painel com todos os dados numéricos do mandato de Chiara Ranieri. Dados coletados até dia 16 de outubro de 2020. (Ilustração: Laura Poli e Natália Santos | Foto do vereador: Pedro Romualdo)
Corte de laços

Na eleição de 2016, o Democratas foi um dos dez partidos que apoiou a candidatura do prefeito Gazzetta. Chiara, inclusive, divulgou um vídeo em seu canal no YouTube destacando as qualidades do candidato, na época.

Com a vitória de Gazzetta, Chiara assumiu a função de líder do governo na Câmara, sendo responsável por representar os interesses do Poder Executivo na Casa de Leis. Entretanto, após cinco meses de mandato, a vereadora deixou a posição, alegando não conseguir dedicar-se ao exercício da função devido a outras atribuições pessoais. 

A saída de Chiara do cargo de líder de governo marcou a transferência do DEM da posição de situação para a de oposição. No novo cenário, a vereadora teve maior abertura para tecer críticas duras e públicas à gestão de Gazzetta. Dentre os temas levados à tribuna, a vereadora compartilhou a dificuldade de confiança no trabalho do Executivo e comentou sobre as fantasias de que as Comissões Especiais de Inquérito (CEIs) seriam uma forma de “caçar o prefeito”

A ‘luz’ no fim do túnel

Respaldada nas ideias liberais do DEM e resguardando os interesses do setor de comércio bauruense, Chiara foi responsável por criar o PL 76. O projeto tinha como objetivo oferecer um plano de reabertura gradual do comércio bauruense durante a pandemia de Covid-19 e um documento de regras de conduta na execução desse processo. O desenvolvimento da proposta contou com a participação de entidades do setor econômico de Bauru.

O presidente da Câmara, José Segalla (DEM), promulgou a lei mesmo após o veto do prefeito. Entretanto, a norma foi suspensa pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), já que ela desrespeitava a classificação laranja de Bauru pelo Plano de São Paulo, do governo de São Paulo. Nessa fase, não poderia haver a flexibilização de abertura prevista no projeto. Posteriormente, o TJ-SP recuou na decisão e liberou a exercício da norma municipal, com algumas alterações, principalmente em relação aos horários de funcionamento dos comércios. 

Além da reabertura do comércio, Chiara posicionou-se a favor da volta das aulas durante a pandemia. Em setembro de 2020, durante sessão ordinária, a vereadora comentou que os professores devem ter consciência de seu papel como linha de frente e pediu para que os profissionais promovessem “uma discussão profunda sobre o papel da escola e sobre o papel de cada um nesse momento”. 

Do início do mandato até setembro de 2020, Chiara recebeu R$ 275 mil pela sua atuação no Legislativo bauruense, segundo o Portal de Transparência da Câmara Municipal.

Ao longo de cinco semanas de realização dessa reportagem, Chiara não concedeu nenhuma entrevista, nem forneceu documentos ou mesmo depoimento gravado. Segundo sua assessoria, a vereadora teve “muitos contratempos” com sua campanha eleitoral e a de Dr. Raul, candidato à prefeitura de Bauru pelo DEM. 

Pílulas do Poder é o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Jornalismo de Egberto Santana e Natália Santos na Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC) da Unesp, com orientação da Profª. Drª. Suely Maciel e tem o apoio e a revisão da equipe do Jornal Dois. 
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