“Esse projeto é pra fechar sala de aula” afirma professora da E.E. Christino Cabral

Projeto do Governo do Estado de São Paulo vai tirar quase mil alunos de onde eles estudam

Reportagem publicada em 21 de dezembro de 2017

Ato em frente à Escola Estadual Christino Cabral levou alunos, pais e professores para se posicionar contrários ao projeto de Escola em Tempo Integral (Foto: Lorenzo Santiago/ JORNAL DOIS)
Por Lorenzo Santiago

Final de tarde de terça feira, 19, uma manifestação reunia mais de 100 pessoas no Jardim Estoril, Zona Sul de Bauru. A manifestação misturava pais, alunos e professores em torno de uma escola estadual, contrários a implementação do projeto de ensino integral.

O projeto do Governo do Estado de São Paulo em parceria com o MEC (Ministério da Educação) foi aprovado na Escola Estadual Christino Cabral. A escola pode se tornar uma Escola em Tempo Integral em 2018. Após ser indicada pela Secretária de Educação do Estado de São Paulo para ser mais uma escola incluída no projeto, a instituição aprovou a medida, por meio do Conselho de Escola, e se não houver mudanças, terá seu ensino feito de forma integral a partir do ano que vem.

O que isso significa?

Todas as turmas do Ensino Médio terão aulas no período da manhã e da tarde todos os dias.

O que isso implica?

Com turmas tendo aulas o dia inteiro, não há mais diferença dos alunos da manhã e da tarde. Com isso, diminui o número de salas. Além disso não há mais aulas a noite. Dos 1300 estudantes que hoje estão no Christino, apenas 350 terão a oportunidade de se matricular ano que vem.

A medida restringe o acesso ao Christino Cabral. Mas esse não é o principal motivo que levou pais, alunos e professores a manifestar um posicionamento contrário ao projeto Escola em Tempo Integral. Eles alegam que a falta de diálogo e a pressa em aprovar o projeto acabaram prejudicando a reflexão a cerca do que de bom e ruim essa mudança poderia trazer.

Toda essa polêmica na escola começou em 2015, ano em que o projeto foi vetado pelo Conselho de Escola. Para se tornar uma escola com ensino integral, o Conselho de Escola precisa aprovar o projeto. O Conselho é composto por pais, alunos, professores e funcionários. Depois disso, o Diretor da escola precisa inscrever a escola no programa, atendendo os requisitos (ter diploma e mínimo de 3 anos em escolas estaduais).

Manifestação reúne mais de 100 pessoas e conta com a presença da Polícia Militar (Foto: Bibiana Garrido/ JORNAL DOIS)

 

A proposta de ser uma Escola em tempo Integral voltou este ano e foi aprovada pelo Conselho de Escola no dia 10 de Agosto.

Depois da aprovação, foi formado um Comitê por pais, alunos e professores alegando que não houve discussões suficientes, e que a implementação do projeto foi apressada e desorganizada. A começar pelo tempo em que se teve para debate e reflexão. Segundo o Comitê, as discussões iniciais ocorreram em Julho, mês de recesso escolar. Na volta das férias houve a apresentação do projeto e foi estipulado que dias depois, 10 de Agosto, haveria a votação. Professores se reuniram para tirar um posicionamento. Com os alunos foi feito um plebiscito com as opções SIM para escola integral ou NÃO. Os professores que a reportagem entrevistou afirmam que o NÃO ganhou.

Apesar de os pais e professores considerarem que o ensino integral é o ideal para a formação do jovem adolescente, o modelo e o contexto em que está sendo implementado é visto por eles como muito distante do necessário. São muitos os problemas apresentados pelo Comitê. A começar pela redução no número de estudantes atendidos pelo novo programa. São cerca de 350. Um número muito reduzido se comparados aos 1300 que hoje frequentam o Christino Cabral.

Outro ponto levantado pelo Comitê é a elitização que haverá no Colégio. Um professor membro do comitê que não quis se identificar por medo de represália afirmou que “A maioria dos alunos da tarde trabalham de manhã. Esses alunos não serão mais contemplados porque eles estão em uma situação de vulnerabilidade social e não podem deixar de trabalhar. E como a gente sabe, o novo modelo de escola vai ter período noturno durante três anos, só para formar aqueles que já estão estudando hoje no Christino. Então, só vai ficar na escola quem não precisa trabalhar e tem condições.”

“Daqui a um tempo a clientela que existe hoje aqui no Christino não vai mais existir. Vão vir alunos de todas as partes da cidade que tem condições de ficar aqui o dia inteiro. A maioria dos nossos alunos não tem condições de ficar.”

Um aspecto destacado e muito pelo Comitê é a “realocação” dos alunos que terão de sair para outras escolas. A opção mais próxima é a Escola Estadual Ernesto Monte que está a 1 quilometro e meio de distância do Christino. Os pais reclamam que os filhos sairão de uma escola que muitos deles estudaram, ou seja, já há um vinculo com o Christino Cabral. “Vai ter problema de salas muito cheias no Ernesto. Não tem como meu filho estudar assim” disse um dos pais do Comitê que também não quis se identificar.

O número de professores na escola também vai reduzir. Dos 50, ficarão apenas 15. Os outros serão realocados para escolas que nem se sabe ao certo se há vagas disponíveis. “A gente recebeu uma lista com as escolas que a gente pode ir. Eu liguei pra uma dessas escolas e me disseram que eles não estão sabendo de nada. Então, nem nós, professores, sabemos pra onde vamos” explicou um professor do Comitê que também optou por preservar sua identidade.

Os professores que vão continuar dando aula na escola terão uma bonificação de 75% no salário, enquanto os diretores receberão 100% a mais. Tathiane Nunes é professora e membro do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP). Ela afirma que, para os professores “esse valor é, de certa forma, um reconhecimento do governo de que a gente precisa ganhar mais e ao mesmo tempo é uma forma de fazer com que o professor suporte toda essa pressão. Você perde o vínculo com outros professores, você funciona de maneira diferente de outras escolas, você não pode faltar… Então é uma forma de ‘vou ter que aguentar se não eu não pago minhas contas.’”

Houve tentativa de contato com a Direção da Escola Estadual Christino Cabral que não quis se pronunciar. Até o momento, a Diretoria de Ensino da Região não atendeu aos telefonemas da equipe. Assim que houver o contato com qualquer uma das fontes a matéria será atualizada.