Indo para onde: a história de mulheres refugiadas no Brasil

Projeto Via foi o Trabalho de Conclusão de Curso de duas jornalistas que mostra o contexto de mulheres que saíram de seus países fugindo de conflitos

Reportagem publicada em 11 de julho de 2019

Mary Boada, a única das entrevistadas que mora em Bauru. É venezuelana e trabalha no Bar da Rosa (Foto: Sofia Hermoso / Projeto Via)
Por Lorenzo Santiago

A série #Balbúrdia do Jornal Dois traz trabalhos e pesquisas feitas nas universidades de Bauru, mostrando o impacto e a relevância destas produções para a sociedade. Neste terceiro episódio contamos a série de reportagens feitas pelas jornalistas Amanda Casagrande e Sofia Hermoso sobre a situação de mulheres refugiadas que vivem no Brasil hoje. 

O Projeto Via apresenta três perspectivas sobre o contexto de mulheres que, por diversos motivos, foram forçadas a deixar o país de origem. A primeira parte – “A Travessia” – aborda o cenário global do refúgio: porque as pessoas são levadas a deixar suas casas, quem ajuda à nível global e nacional para quem está nessas condições, quais são os acordos mundiais entre os países e as dificuldades para a saída das pessoas de seus países. Tudo isso permeado pelo recorte de gênero e embasado com dados de instituições que discutem essas questões.

A segunda parte foi chamada de “A Acolhida” e traz a chegada das pessoas para novos países. A busca por moradia, trabalho, documentação e a adaptação em um geral são desafios para as mulheres que viajam sozinhas ou com filhos. Os programas nacionais e da Organização das Nações Unidas (ONU) para o acolhimento em um país estrangeiro envolve muita burocracia. Ter a assistência necessária para lidar com os trâmites legais é parte fundamental desse processo.

Maguy Makaya, refugiada congolesa, com as filhas Bruna, 8, e Christine, 12 (Foto: Sofia Hermoso / Projeto Via)

A terceira reportagem explora a subjetividade dessas pessoas. Não conhecer o cenário que vão enfrentar dificulta ainda mais as condições para mudar de país. “A Identificação” é o nome da última das reportagens do projeto. 

O trabalho foi desenvolvido em São Paulo, já que a capital paulista é uma das cidades com maior fluxo migratório de pessoas refugiadas em todo o país. As ex alunas da Unesp ficaram 10 dias atrás de pessoas, associações e redes de acolhimento para as reportagens. 

“Primeiro a gente pesquisou muito. Elencamos todas os lugares que faziam esse trabalho com as pessoas refugiadas e que eram interessantes para as matérias. Antes de irmos, a gente fez uma série de posts nas redes sociais também, procurando alguém que conhecesse mulheres na condição de refúgio. E aí tivemos muitas respostas” relembra Amanda.

Além do desafio de encontrar as mulheres para as entrevistas, os custos para desenvolver o trabalho de campo foi outra dificuldade. “Ficar andando em São Paulo, gastando com transporte, carregando equipamentos pra lá e pra cá foi bem trabalhoso. Ainda mais por se tratar de uma cidade que a gente pouco conhecia” diz Sofia.

Salsabil Matouk, síria que trabalha vendendo comida árabe. Mora em São Caetano do Sul (Foto: Amanda Casagrande / Projeto Via)

O refúgio é um tema que já havia sido explorado por vários trabalhos ao longo da graduação. Mas o Projeto Via se tornou importante como trabalho acadêmico por agrupar dados e histórias em diferentes formatos: texto, foto e vídeo. Para isso foi necessário um trabalho interdisciplinar. Estudantes de Artes Visuais e Rádio TV auxiliaram na produção de ilustrações e vídeos para as reportagens. 

“Foi muito bom ter gente de outros cursos trabalhando com a gente. Deu mais qualidade e só mostra a importância desse contato entre os diferentes conhecimentos dentro da universidade” pontuou Amanda Casagrande.

Depois de concluído o trabalho, Sofia começou a mandar para diversos veículos de comunicação. A ideia era ampliar a abrangência, pautar outras mídias e ainda ter reconhecimento pelas reportagens feitas. O Le Monde Diplomatique – jornal francês com tiragens no Brasil – gostou e colocou a primeira das reportagens no site no dia 19 de Junho. 

“Eu saí mandando pra muitas mídias. Algumas responderam mas só faziam conteúdos exclusivos. O editor do le Monde topou e eles pediram pra adequar o texto para o padrão deles. Mas foi muito bom pelo alcance e pelo reconhecimento de ter um texto publicado em uma mídia internacional’ apontou Sofia.

O projeto entrevistou 5 mulheres refugiadas que vivem no Estado de São Paulo. Uma venezuelana, uma congolesa, uma nigeriana e 2 sírias (Imagem de arquivo)

 

O recorte de gênero foi definido antes mesmo de começar o trabalho. A temática que ainda não tinha sido escolhida. Pela importância global, o refúgio foi o assunto delimitado pela dupla. Desde 1951, foram mais de 28,5 milhões de pessoas forçadas a saírem de seus países por conflitos religiosos, políticos, étnicos, indo buscar refúgio em outro território. Os números são do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). A dimensão do gênero neste conflito norteou o trabalho das duas jornalistas durante todo o processo.

Amanda e Sofia pretendem dar continuidade ao Projeto Via com a participação no 11º Prêmio Jovem Jornalista do Instituto Vladimir Herzog. O instituto vai selecionar as 10 melhores propostas de pautas que abordem o tema do refúgio.