“Estabilidade do servidor público não é privilégio”, diz Professora Bebel
Deputada e presidente da Apeoesp criticou a PEC 32, que tramita na Câmara dos Deputados, e o PLC 26, proposto pelo Dória na Alesp; ambos projetos alteram as regras do funcionalismo público
Publicado em 23 de setembro de 2021
Por Camila Araujo
A deputada estadual Professora Bebel (PT) defendeu em entrevista ao Jornal Dois que a estabilidade do servidor público “não é um privilégio”, mas sim segurança e compromisso de atuar na área em que a ou o trabalhador tenha se especializado. A declaração foi feita no início do mês, quando a parlamentar esteve em Bauru.
“Não faz nenhum sentido você enxugar um servidor profissionalizado, que é regido pelos princípios da administração pública e da impessoalidade”, declarou a deputada, e apontou para o caso de Luis Ricardo Miranda, servidor público do Ministério da Saúde e irmão do deputado federal Luis Miranda (DF), que tornou conhecida uma situação de irregularidade na compra da vacina Covaxin, tema que foi então amplamente discutido na CPI da Pandemia, no Senado Federal. “Se ele não fosse concursado, seria sumariamente demitido”, aponta Bebel.
Questionada pela reportagem sobre como reverter o quadro de retirada de direitos de servidores do Estado, a Professora Bebel afirmou que seria preciso retirar todo o texto da Reforma Administrativa (PEC 32), uma proposta de emenda à constituição apresentada na Câmara dos Deputados pelo deputado Arthur Oliveira Maia (DEM). Ela também comentou que houve “um revés positivo” quando o relator da proposta apresentou, em 31 de agosto, uma versão substitutiva do texto original.
Em um novo texto apresentado pelo relator na quarta-feira (21), aprovado nesta quinta pela Comissão Especial da Câmara, depois de a deliberação ter sido adiada quatro vezes ao longo do mês, o deputado manteve temas criticados pela oposição, como a previsão de redução de 25% na jornada de trabalho e de salário dos servidores.
Ao Jornal Dois, Bebel também criticou o Projeto de Lei Complementar 26, apresentado à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) em regime de urgência por João Dória. O PLC promove mudanças em regimes legais de servidores públicos, e é apontado como retrocesso aos direitos trabalhistas historicamente conquistados pela categoria.
Isso porque propõe o fim das seis faltas abonadas por ano, de forma que a ou o trabalhador passaria a ser remunerado somente pelos dias efetivamente trabalhados. Também propõe incorporar Bonificação por Resultado no salário, sem que haja reajustes salariais.
Servidores afastados por licença-prêmio e faltas abonadas, na proposta, não têm mais o direito ao recebimento do adicional de insalubridade durante o período de afastamento, e a contratação de servidores temporários em caso de greve ou calamidade pública passa a ser autorizada. Por fim, impossibilita a retirada da a licença-prêmio em dinheiro, e reduz o tempo da licença de 30 para 25 dias.
Já a PEC 32 altera normas que regem o trabalho no funcionalismo público e pode comprometer serviços essenciais à população, além de acentuar as propostas de “enxugamento do Estado”.
Deputada e sindicalista
Maria Izabel Azevedo Noronha, ou apenas Bebel, é representante de uma categoria do funcionalismo público, a de professores, tema central em sua atuação na Alesp. Antes de ser deputada, a docente tem uma carreira como presidente do Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo (Apeoesp) de cinco mandatos, tendo sido eleita pela primeira vez em 1999, e posteriormente em 2008, reeleita nas três eleições seguintes, cumprindo o cargo até o momento.
Por conta da pandemia, a eleição para uma nova diretoria do sindicato, a nível estadual e municipal, está há um ano atrasada. A o pleito eleitoral tem previsão para ser realizado até o fim deste ano, 2021, quando Bebel, segundo ela, não vai disputar a presidência, mas pretende permanecer na coordenação do sindicato.
Em relação a medidas tomadas na área da Educação pelo governo federal e tidas como um retrocesso pela Apeoesp, como o Novo Ensino Médio, cuja implementação começa em 2022, a deputada afirmou que “a questão central é que não houve nenhum debate com a comunidade escolar” e indagou: “porque é sempre de cima pra baixo?”
O Novo Ensino Médio inclui a ampliação da carga horária de 2,4 mil horas para 3 mil horas do ano letivo. Muda também as diretrizes curriculares, processo em que o estudante passa a escolher quais disciplinas quer cursar, com a possibilidade de receber formação técnica e profissionalizante na escola, em detrimento dos conteúdos de base que eram adotados pelas Lei de Diretrizes e Base da Educação.
Entre as críticas apontadas pela Apeoesp, a principal delas é que o estudante do ensino público será prejudicado porque sairá do colegial com menos conhecimento. Veja na cartilha “NOVO” ENSINO MÉDIO produzida pelo sindicato clicando aqui.
A deputada afirma que com as mudanças, o número de matrículas vai cair pela metade, já que parte dos estudantes trabalham e não vão poder cursar o novo formato. Ela diz ainda que “impedir o retrocesso” é “na luta como nós temos feito”.
Apeoesp Subsede Bauru
A Apeoesp Subsede Bauru atualmente é dirigida pelo Coletivo Chão de Giz, uma articulação de docentes da rede estadual que surgiu durante a Greve dos Professores em 2015. Oposição à Articulação Sindical, vertente a qual Professora Bebel pertence, os membros do Chão de Giz chamam a atuação da deputada de “direção burocratizada”.
“Ela conduz o sindicato de forma a não apostar na luta dos trabalhadores, apenas para manter a hegemonia sobre o sindicato”, diz a direção bauruense ao J2. Eleito em 2017, o Chão de Giz é sucessor de uma gestão dirigida por membros da Articulação Sindical em Bauru, que vão disputar à direção nas próximas eleições.
“A gente entende que o sindicato deve se manter independente de mandatos e governos”, comenta o coletivo em relação a dupla atuação de Professora Bebel, como dirigente sindical e deputada, afirmando ainda que “nós temos a concepção de que o sindicato deve ser instrumento de luta dos professores”. Para a direção bauruense, a nível estadual “o sindicato está sendo organizado de forma burocrática, como um instrumento interno e como maneira de judicialização da luta”.
O Chão de Giz opina ainda que Maria Izabel é “formada pelo petismo e pelo campo reformista que acredita em acordos com a burguesia para poder fazer pequenos avanços”, apontando que o momento é de “maior ataque” contra a categoria, e que, por outro lado, “não é o maior momento de ação a altura de um sindicato”.
Em fevereiro deste ano, professores da rede estadual iniciaram uma greve sanitária com pauta única de “luta pela vida”. O J2 conversou com o sindicato e com trabalhadores da rede à época, que mostraram um cenário de insegurança com o retorno às aulas presenciais, marcadas para o dia 8 de fevereiro.
A greve foi convocada pela direção estadual da Apeoesp, para que professores e professoras não comparecessem de forma presencial às aulas, e mantivessem as atividades à distância. Para o Chão de Giz, esse foi um erro: “Mesmo os professores que trabalham remotamente não receberam por conta da greve sanitária”. De acordo com o coletivo, teria sido mais efetivo interromper as atividades, mesmo à distância, como forma de protesto.
Para a deputada, a judicialização não é uma “burocratização” da estrutura sindical, e sim uma de suas frentes de luta. Sobre a greve sanitária ela avalia como positiva. Bebel, por sua vez, critica a atuação da atual diretoria da Apeoesp em Bauru, afirmando que não vê os membros da oposição na cidade de São Paulo, para onde, segundo ela, outras subsedes comparecem com a base sindical.