Por Bibiana Garrido
Muita água rolou desde o dia 14 de fevereiro, quando aconteceu a contagem de pontos das agremiações que desfilaram nos dias 10 e 12 em Bauru. Bloco Pé de Varsa ganhou na categoria, por desempate, e a Acadêmicos da Cartola levou a melhor entre as escolas.
A décima terceira vitória da águia foi contestada por conta da nota de um jurado e representantes da Mocidade Unida da Vila Falcão, segunda colocada, pediram revisão. “A gente procura profissionalizar a escola, mas acaba sendo avaliado por jurados que não tem qualificação”, opina Pedro Godoy, diretor da bateria da Mocidade, a Bacharelado do Samba.
Recurso apresentado pela escola à Secretaria de Cultura apontou erros na pontuação do casal Porta Bandeira e Mestre Sala da Cartola. O jurado em questão teria avaliado três casais do desfile, enquanto o regulamento diz que somente é passível de nota o primeiro casal que aparecer na avenida.
Em pronunciamento público, a Mocidade explica que “após atribuir as nota 9,9 ao 1º casal, 9,6 ao 2º casal e 9,7 ao 3º casal, o jurado fez a média aritmética das notas que resultou na nota final 9,7 pontos”. E reitera: “É absolutamente desconhecido no mundo do carnaval um jurado que atribua a sua nota por média aritmética”.
O pedido sugeria a anulação das outras duas notas e manutenção apenas da primeira — o que faria da Mocidade a nova ganhadora. A Secretaria de Cultura reconheceu o equívoco da parte do avaliador e decidiu anular todas as notas dadas pelo jurado à todas as agremiações e, assim, a Cartola seguiu campeã do carnaval.
Para Paulo Madureira, presidente da Cartola, a situação foi resolvida. “Nota de jurado não cabe recurso, a prefeitura fez a coisa certa”, avalia. “O recurso é válido quando existe má fé, nota é nota, justificativa é justificativa. São coisas separadas”.
A Mocidade deixa claro que não foi motivada por nenhum tipo de rivalidade, mas pela questão técnica de saber os quesitos pelos quais foi julgada. “Trabalham o ano inteiro pra você ver o jurado te avaliar de forma completamente errada”, diz o diretor da Bacharelado. “Pro pessoal da bateria é importante, tem ritmista ensaiando desde maio”.
Escolha dos jurados
A bancada do carnaval deste ano contou com 27 jurados. Não há um critério definido para a seleção das pessoas: são convidadas ao estilo “quem indica”. Geralmente são escolhidas pessoas que afirmam se identificar e gostar da festa, sem a necessidade de possuir conhecimentos técnicos e específicos sobre os desfiles. “É uma atividade que não é remunerada, é totalmente sem custo para a prefeitura”, explica Luiz Fonseca, secretário de Cultura. “É mais um desejo da pessoa de ser jurado do carnaval”.
Depois de eleger candidatos, a Secretaria de Cultura envia uma lista para cada agremiação, que pode aprovar ou vetar nomes. “É o que tem que acontecer pra ser totalmente transparente esse processo”, pontua Luiz. Em caso de veto, a busca pelos jurados recomeça até que todos sejam aprovados pelos blocos e escolas.
O tema dá pano pra manga entre quem faz o carnaval sair no sambódromo. Dona Olívia, presidente da Coroa Imperial, pensa que as coisas deveriam ser feitas de um jeito diferente. “Jurado de escola de samba não pode ser de Bauru. Tem que chegar um dia antes, ficar confinado num hotel, ninguém conhece ninguém”, propõe.
Sem recursos, o poder público não teria condições de arcar com as despesas que viriam com o investimento no corpo de jurados. É o que relata o secretário de Cultura: “Nós não temos fôlego pra trazer ninguém de fora, custa dinheiro. Como é que eu vou buscar 27 jurados fora de Bauru? Não dá pra fazer isso”.
“Nós temos comunidades que apresentam escolas com uma qualidade grande, as baterias são muito boas e isso tá a cada dia crescendo”, fala o diretor de bateria da Mocidade. “Mas eu acho que ainda precisa de uma profissção maior. Tanto de quem julga, quanto de quem participa”.
Liga independente
“Existe a possibilidade e a tendência de profissionalização do carnaval de Bauru, isso eu falo de boca cheia”, afirma Luiz, secretário de Cultura. “Isso só vai ser possível quando eles resolverem criarem a liga”.
A liga das agremiações do carnaval bauruense já quase andou para a frente. Reuniões começaram a ser feitas, mas logo se desmembraram. O projeto ficou na cabeça das pessoas que trabalham com o carnaval na cidade.
“Chega nesse ponto, esses problemas do carnaval, tudo é porque não existe uma liga”, argumenta Pedro, que está na bateria da Mocidade há quatro anos. Giedry Pires, fundadora do bloco Esquadra da Indepa, concorda: “uma liga ajudaria muito”.
Como um órgão independente da prefeitura e das lideranças de escolas de samba e blocos, a liga seria responsável pela organização do carnaval — seria extinta a abertura de licitações e toda a verba pública seria repassada diretamente para essa nova entidade representativa. Luiz sugere que “a liga também pode fomentar outros recursos no mercado pra se consolidar”.
Madureira também é a favor da criação de uma liga independente, mas com peso de votos. “Quem vai fazer parte dessa liga e qual seria a função dela?”, questiona. “Não adianta chegar um escola amanhã e ter o mesmo direito de voto. Sou a favor de uma liga independente das escolas de samba, com pessoas que gostam de carnaval, que entendem de carnaval, pode ter jornalista, empresário, gente que gosta de cultura”, propõe o presidente da Cartola.
Nesse ponto, o secretário de Cultura é da opinião de trazer gestores para compor a liga. Pessoas que possam traçar estratégias de marketing e contribuir para o crescimento e fortalecimento do carnaval em Bauru.
“Tem que haver comprometimento e engajamento das instituições num processo claro e muito bem calçado juridicamente”, expõe Luiz. “O dono de uma escola não pode ser também presidente da liga, entende? É uma associação independente. Isso tem que ficar muito claro: liga é liga, escola é escola”.
Dona Olívia engrossa o time à favor da organização: “Essa liga deveria tomar conta do sambódromo e fazer eventos das escolas lá. Todos tem que falar a mesma linguagem, com um único objetivo”.
O uso do sambódromo, de acordo com a Secretária de Cultura, está aberto a todas as agremiações que desejarem utilizar o espaço durante o ano. A diretoria da Coroa Imperial afirma que ainda é difícil tomar a iniciativa por conta dos gastos.
Para o diretor da Bacharelado do Samba, não é obrigação da prefeitura organizar o carnaval. “A liga não é a solução, mas é o primeiro passo”.
Outros carnavais
“Primeiro: se você gosta duma escola de samba, gosta de samba, então vamos sambar, tá?”, diz Dona Olívia, com um sorriso no rosto e décadas de carnaval nas costas.
O carnaval do ano que vem cai no mês de março, o que vai melhorar a questão do repasse da verba para as agremiações. Em 2017, o dinheiro saiu uma semana antes dos desfiles. Neste ano, foram dois dias antes.
“Esse ano teve uma empresa que entrou com recurso na licitação e atrasou toda a burocracia”, explica o secretário. “Eu não posso trabalhar com dinheiro de um ano pro outro, o orçamento do Carnaval 2018, é de 2018. E o caixa da prefeitura abriu dia 22 de janeiro”.
Segundo a Polícia Militar, foram aproximadamente 35 mil pessoas que assistiram aos dois dias de desfile. Na contagem da Secretaria de Cultura, somadas as pessoas que estavam ali trabalhando nas escolas e no apoio da prefeitura, na estrutura, na praça de alimentação e nas próprias agremiações, o número chega a 40 mil.
O turismo é um fator em potencial a ser cada vez mais explorado pela prefeitura. Pesquisa realizada no sambódromo mostrou que 80% das pessoas que vieram para o feriado são do estado de São Paulo. Também tinha gente da Bahia, de Goiás, do Paraná e Minas Gerais.
A Secretaria de Cultura vê a ampliação e reforma das arquibancadas do sambódromo como uma forma de acomodar o público e ampliar a capacidade da festa. Colocar arquibancadas dos dois lados da avenida e subir os camarotes é uma ideia colocada pelo secretário de Cultura. Passar a organização para a liga, assim que formada, também está nos planos.
“É um evento consolidado, tem que expandir e melhorar esse fluxo”, afirma Luiz, sobre o carnaval de Bauru se firmar como um atrativo turístico. “É centro do estado, nossos vizinhos tem seus circuitos ecológicos e nós aqui não temos nada disso. Temos turismo de negócios, de saúde e de educação”, avalia o secretário. “A gente tem potencialidades”.