Aplicativo mapeia locais de Bauru e promove acessibilidade para pessoas com deficiência visual

Desenvolvido pelo projeto ‘Biblioteca Falada’, o app SIGA disponibiliza informações de contexto histórico e descrição em áudio de 75 pontos de interesse no município

Publicado em 10 de junho de 2021

Por Letícia Garcia

Bauru conta com mais uma opção para quem quer conhecer a história e a estrutura da cidade. Já é possível baixar gratuitamente o aplicativo de celular “SIGA – Guia acessível da cidade”. Além da explicação sobre lugares de Bauru, a ferramenta foi pensada para que pessoas com deficiência visual possam entender e participar do espaço urbano.

O SIGA une dois tipos de informações em áudio: dados históricos, sociais e culturais sobre locais de Bauru, e a descrição da arquitetura, estrutura de acessibilidade e localização desses ambientes. O objetivo é auxiliar pessoas cegas e com baixa visão a conhecerem esses espaços e permitir que elas se apropriem de conhecimentos sobre a cidade.

A plataforma oferece informações em áudio sobre 75 pontos de interesse histórico, social e cultural, como: prédio da Prefeitura, Câmara Municipal, Parque Vitória Régia, entre outros. Os locais foram escolhidos em parceria com alunos e alunas do Lar Escola Santa Luzia para Cegos. 

O aplicativo foi lançado em maio de 2021, um ano após o início de seu desenvolvimento. Foi elaborado pelo Biblioteca Falada, projeto de extensão da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Bauru.

Suely Maciel, professora e coordenadora do Biblioteca Falada, explica que dois eixos da cidade foram levados em consideração nessa primeira versão do aplicativo: a avenida Rodrigues Alves e a avenida Castelo Branco. O trajeto inclui desde o Horto Florestal e o Colégio São José, até o Lar Escola Santa Luzia.

Mapa sonoro 

Para Larissa Bonadio, estudante de Computação e integrante da equipe que desenvolveu o aplicativo, o diferencial do SIGA é trazer informações de pesquisa histórica e audiodescrição, possibilitando que usuários identifiquem os locais que estejam próximos à sua localização geográfica.

“Esses locais são marcados no mapa, e a partir disso, o usuário pode acessar sua página, com a imagem do local, seu endereço, a categoria, os áudios, além de outras informações”, conta a estudante.

De acordo com Suely, a motivação para criar o aplicativo partiu de um pedido dos estudantes do Lar Escola Santa Luzia em 2019. “A coordenadora do Lar Escola disse que os estudantes tinham interesse em saber como eram alguns locais da cidade de Bauru, quais os aspectos do prédio da prefeitura, da Câmara, da Batista de Carvalho, principalmente”, conta. 

O conceito do mapa sonoro surgiu em seguida, ainda em 2019, inspirado em outras duas ferramentas: o aplicativo AudioLab Geo, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), e os áudios disponibilizados em visitas guiadas da Prefeitura de São Paulo, que descrevem edifícios antigos no centro da cidade. “O que me veio à cabeça foi desenvolver uma junção das duas ideias: áudio com sistema de geolocalização e audiodescrição de locais de interesse”, relata Maciel.

O que é e como é produzida a audiodescrição

A audiodescrição (AD) é um recurso de acessibilidade voltado a pessoas idosas ou com deficiência visual, intelectual e dislexia que traduz imagens ou conteúdos audiovisuais em palavras, conforme definição da organização Fundação Dorina Nowill para Cegos. 

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, aprovou em 2020 a obrigatoriedade de recursos acessíveis no cinema brasileiro. Entre os recursos se encontra a audiodescrição.

Gabriel Aquino, consultor de audiodescrição do projeto Biblioteca Falada, lembra que para produzir audiodescrição é preciso seguir algumas etapas: roteiro, revisão, consultoria, locução e edição final.

“É preciso ler o roteiro de AD e verificar se há clareza na descrição dos ambientes, de forma que seja compreensível para a pessoa com deficiência visual”, explica.

Consultores de audiodescrição são pessoas cegas ou com baixa visão. Gabriel é cego, e mora em Belo Horizonte (MG), de onde presta serviços ao projeto. “Eu recebo o material por escrito num documento word, ou docs (…) e aí eu tenho um leitor de telas que converte o que está digitado em material sonoro. Assim eu consigo ter domínio total do trabalho. Com o leitor, eu consigo passar pelas palavras, pelas frases, pelo parágrafo, como eu quiser.

E tenho total autonomia: modifico palavras, coloco sugestões e inverto, às vezes, uma frase ou outra de lugar”, relata.

No dia 18 de maio, os consultores de audiodescrição e estudantes do Lar Escola receberam a versão experimental do aplicativo, para avaliar os recursos oferecidos. A versão “beta” representa um estágio de desenvolvimento que já é considerado adequado para liberação ao público.

Para Gabriel, esta é a etapa mais importante, porque é onde se identificam possíveis erros, soluções, e, caso seja necessário, a ferramenta volta para o desenvolvedor. As características necessárias para que um aplicativo seja considerado acessível para pessoas com deficiência são estabelecidas pelas Diretrizes de Acessibilidade para o conteúdo da WEB (WCAG, do inglês: Web Accessibility Content Guidelines). “Todo aplicativo, site, ferramenta digital, precisa seguir parâmetros, diretrizes de acessibilidade”, enfatiza.

Não só para Bauru, não só para cegos

Gabriel Aquino afirma que o aplicativo SIGA é útil para todas as pessoas, cegas ou não. “A plataforma é interessante para quem é cego e mora na cidade de Bauru poder conhecer os locais, os patrimônios, os edifícios, que estão lá na cidade e muitas vezes passam despercebidos por nós que não enxergamos, mas que também passam despercebidos por quem enxerga”.

Ele lembra ainda que é um material interessante para quem não conhece Bauru, como ele mesmo, que mora em Belo Horizonte. “Eu estou fazendo consultoria sobre um material daí, e acabo conhecendo monumentos, locais, que não vou poder conhecer por foto”, detalha.

Grasiela de Moraes, pedagoga do Lar Escola Santa Luzia para Cegos, afirma que o aplicativo também representa uma oportunidade para todos os estudantes do município conhecerem a história e características dos patrimônios e edifícios da cidade. “Esse trabalho também abrangerá seu uso no ensino de disciplinas como História nas escolas de Bauru, pois conhecer a cidade e os pontos principais faz parte da educação de qualquer cidadão”, aponta.

O Biblioteca Falada continuará adicionando novas informações ao banco de dados do mapa sonoro e ainda pretende incluir informações sobre outras cidades de São Paulo, conforme informou Suely Maciel à reportagem do J2. “A ideia é que a gente consiga expandir o mapa sonoro para outras localidades do estado, quiçá do Brasil, mas para isso será necessário estabelecer parcerias”, explica.

Relação entre projeto e Lar

Grasiela afirma que o projeto da Unesp de Bauru é “de suma importância para os alunos e alunas do Lar Escola”. Ela conta que foi a partir da parceria com o Biblioteca Falada que os estudantes da instituição passaram a ter maior acesso à audiodescrição.

Com a chegada do SIGA, comenta a pedagoga, “o trabalho realizado no Lar terá um suporte a mais. Antes de levá-los para conhecer os ambientes, eles terão o apoio do SIGA, para que possam  fazer uma imagem mental de cada lugar, e depois vivenciá-lo na prática”.

Como explica Suely Maciel, a plataforma é um meio de ultrapassar as barreiras sociais enfrentadas por pessoas com deficiência em Bauru, que vivem em isolamento antes mesmo da pandemia do novo coronavírus.

Site

Além do aplicativo de celular, a equipe do projeto também está trabalhando no desenvolvimento de um site que irá complementar as informações do aplicativo. “A diferença é que no site, além dos arquivos de áudio, fotografias e mapa, haverá também o equivalente escrito de cada áudio. Então, o usuário poderá acessar o texto relativo ao áudio em escrito, para que ele possa visualizá-lo”, explica a professora Suely.

O aplicativo “SIGA: Guia Acessível da Cidade” encontra-se disponível para download na loja de aplicativos Google Play, na versão beta, para o sistema operacional Android.

Todas as imagens desta matéria possuem texto alternativo. 

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