A Carta dos Trabalhadores da Cultura à prefeita eleita Suéllen Rosim e os desdobramentos do setor para 2021

Saiba como coletivos e grupos culturais da cidade vêm se organizando, a quantas anda o diálogo com a prefeita-eleita e quais as perspectivas do setor para o próximo ano

Publicado em 21 de Dezembro de 2020

Dentre os presentes na reunião de entrega da carta a prefeitura estavam Alison Carlos - Presidente da Liga das Escolas de Samba e Blocos de Bauru; Regina Ramos, Integrante do Grupo Literário Expressão Poética, Sociedade Amigos da Cultura, Associação de Teatro de Bauru e Região e do Fórum Regional de Cultura; Ivo Ferreira, membro do grupo Músicos em Ação de Bauru; Tiago Rosa do Coletivo Fuzuê 014 e do Fórum Regional de Cultura,, Tatiana Sá e Suellém Rosim. (Colagem: Letícia Sartori/JORNALDOIS)
Por Letícia Sartori

A prefeita eleita de Bauru Suéllen Rosim (Patriota) recebeu, na última sexta-feira (18), representantes de 27 coletivos e grupos culturais da cidade. Eles entregaram uma carta aberta buscando abrir um diálogo com a nova gestão municipal.

Produzido de forma coletiva, o documento foi a primeira iniciativa de aproximação entre Suéllen e os trabalhadores da cultura local. A carta traça perfis e comprometimentos que a categoria artística bauruense aponta como importantes para a nomeação do próximo secretário de cultura da cidade, escolha de responsabilidade da prefeita.

Pontos de Destaque

A carta foca em pontos específicos, como a necessidade de conhecimento prévio do setor cultural bauruense pelo(a) futuro(a) secretário(a), independentemente de ser funcionário de carreira da pasta ou de fora da administração. Além disso, os grupos culturais pedem que a escolha do nome leve em consideração a experiência em gestão administrativa e de pessoas, e que seja um perfil que facilite a organização e articulação cultural do cenário local. 

“Entendemos que o(a) responsável pela condução dos trabalhos tenha uma articulação com diversos grupos políticos, culturais e privados e, consequentemente, possa buscar parcerias e desenvolvimento para o setor”, apontam os grupos na carta.

Diálogos com a prefeita eleita

A reunião da última sexta-feira pode ser encarada como um desdobramento do trabalho de aproximação e debate político que coletivos e organizações de arte-cultura bauruense desenvolveram ao longo de 2020. Desde o segundo turno das eleições municipais deste ano diversos grupos se reuniram para organizar debates e encontros com os então candidatos à prefeitura.

Post do Festival Multicultural Online Fuzue 014 (@fuzue014)

Um exemplo foi o encontro do dia 24 de novembro com Suéllen, realizado de maneira online com a mediação de Juliana Ramos. O debate atingiu a lotação máxima de 100 pessoas na sala de reuniões online, com perguntas focadas na manutenção do trabalho da Secretaria de Cultura, nomes para um possível secretário e discussão de propostas concretas da então candidata para a pasta. 

Com a eleição finalizada e Suéllen Rosim eleita com 55,98% dos votos tornou-se clara a importância de estabelecer uma via de comunicação com a equipe da nova gestão. A ação foi impulsionada, também, pela insegurança de alguns setores da categoria artística em relação às políticas conservadoras e de extrema-direita do partido da prefeita eleita, o Patriota. Esse fato, inclusive, foi debatido pelos participantes no chat durante o encontro virtual com Suéllen em novembro.

Outra frente de atuação dos grupos culturais se deu com o estreitamento do diálogo com a Secretaria de Cultura. Esse trabalho ocorreu a partir do Fórum Regional de Cultura de Bauru, núcleo que reuniu artistas de diversas cidades da região e que serviu como ponte entre o poder público e as necessidades da classe artística. 

Para Tiago Rosa, artista membro do Fórum Regional de Cultura de Bauru e uma das pessoas responsáveis por entregar a carta à prefeita eleita, o momento atual de transição de poder é marcado pelas incertezas, mas tem mantido a classe artística unida. 

Apesar das divergências políticas, o produtor cultural acredita que o diálogo deve ser mantido. Relembrando o papel de segundo plano que a cultura teve para diversas gestões públicas da cidade, Tiago pontua que “é fundamental ocuparmos espaços dentro e fora da administração pública, para que nossas pautas sejam conhecidas e até mesmo implementadas”.

E a secretaria como anda?

Organizada e redigida de maneira coletiva a “Carta Aberta dos Trabalhadores da Cultura a Prefeita Eleita Suéllen Rosim” marca a discussão atual da classe artística bauruense: quem irá assumir a pasta da Secretaria de Cultura? 

Atualmente sob comando de Rick Ferreira, indicado em abril de 2019 pelo atual prefeito Clodoaldo Gazzetta (PSDB), a secretaria fecha o ano em ritmo acelerado de trabalho no que foi o padrão da pasta em 2020. 

Nos últimos meses a secretaria divulgou e finalizou 4 editais culturais para premiação de artistas, técnicos e produtores locais. O incentivo serviu para que, mesmo durante a pandemia, lives, oficinas e debates culturais continuassem a fazer parte da vida da população, garantindo o pagamento para trabalhadores do setor que tiveram seu ofício impactado

(Arte: Letícia Sartori/JORNALDOIS)

Os editais tiveram verbas de diferentes fundos, desde a iniciativa privada, passando pelo  Fundo Especial de Promoção das Atividades Culturais (FEPAC) até aos fundos federais de emergência cultural estabelecidos pela Lei Aldir Blanc ( Lei Nº 14.017 de 06/2020). Mas todos foram organizados, apurados e contaram com curadoria e mediação da Secretaria Municipal de Cultura, em uma ação coordenada com as secretarias de Finanças e de Negócios Jurídicos para o pagamento de mais de 600 contratos a artistas da cidade.

Para Tiago Rosa, um dos principais impactos do trabalho do Fórum Regional de Cultura foi a construção de editais mais inclusivos, que possibilitaram o apoio financeiro para trabalhadores e espaços culturais da cidade, inclusive os que anteriormente não recebiam o devido reconhecimento e apoio. Segundo o artista, “com a organização da classe, compartilhamos conhecimentos, ganhamos força e causamos um real impacto em nosso território.”

Mais de 27 grupos e organizações culturais da cidade assinaram a carta entregue a Suellén na última sexta-feira. (@fuzue014)

Diz-que-me-disse 

No ritmo quase instantâneo de comunicação em que vivemos, tudo corre na velocidade da luz pelas redes sociais.

A reunião da última sexta-feira mal havia terminado e o seu registro já foi postado nos storys do instagram da prefeita eleita, com foto dela recebendo a carta dos representantes dos artistas. 

O conteúdo da carta na íntegra foi postado no sábado, 19 de dezembro, às 20h, nas redes sociais dos quase 30 grupos e coletivos que assinaram o documento. Foi planejada uma ação conjunta de postagem visando aumentar a divulgação de seu conteúdo para a população bauruense.

A carta dos trabalhadores da cultura foi publicada no mesmo horário em diversas contas de artistas e coletivos da cidade. (@forumregionalculturabauru)

Mas o grande debate sobre o documento veio a partir de uma publicação do site Carnaval em Bauru, que no sábado divulgou uma matéria com a chamada “Suéllen Rosim Assume Compromisso de manter o carnaval em Bauru”, com uma foto da reunião realizada com representantes da cultura. O texto correu os grupos e redes sociais e reacendeu a discussão sobre as verbas públicas para o carnaval municipal – debate agravado por estarmos no meio de uma pandemia.

Já no domingo de manhã, Suéllen Rosim publicou em suas redes sociais um texto desmentindo a matéria do grupo Carnaval em Bauru. Ela pontuou que o tópico não foi debatido durante o encontro, que a cultura “não ficará desassistida” mas a “prioridade de governo é arrumar a cidade, passar pela crise e trazer crescimento”.

O grupo Carnaval em Bauru divulgou uma retratação em que se desculpa pelo erro na colocação referente a reunião com a prefeita eleita e reitera a importância da manutenção das verbas e do apoio do poder público para o evento bauruense. 

“Assim como qualquer outro projeto cultural merece investimentos da municipalidade, independente da necessidade de verba para as outras áreas, pois todos merecem ter acesso a cultura”, diz o texto.

Para saber mais sobre a rede de economia criativa gerada pelo Carnaval municipal acesse as matérias já produzidas pelo Jornal Dois e entenda mais sobre esse debate.

Classe artística e os desafios de 2021 

Quem assumir a gestão da pasta da cultura irá enfrentar 2021 no meio da contínua pandemia da covid19 com o desafio de continuar em articulação, apoio e diálogo com uma categoria artística que fecha o ano cada vez mais unida. 

Fruto da organização e trabalho de artistas e produtores nas mais diversas linguagens, Bauru viu em 2020 o fortalecimento de grupos novos de discussão e articulação no campo da cultura. Exemplo é o próprio Fórum Regional de Cultura de Bauru, que abrange diversas cidades da região e auxiliou secretarias na implementação e divulgação dos editais da Lei Aldir Blanc, fazendo a ponte entre a comunidade artística e órgãos oficiais.

Além do Fórum, semanalmente diversos eventos, lives, debates e organizações continuaram ativas ou nasceram durante este ano. Contamos com a adaptação de projetos já caros à cidade como o Festival de Artes Cênicas (FACE), que teve sua 9ª edição transmitida 100% online e gratuita. E novos projetos como o Festival Multicultural Online Fuzuê, que reuniu artistas independentes locais para apresentações, exposições, rodas de conversa e outras atividades durante todo o ano. 

A rede de economia criativa e de produção cultural no município se expande e já começa a delinear o cenário cultural de 2021. Bauru conta com 13 aprovações no Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo de 2020 (PROAC-SP 2020), que reúne editais de incentivo à cultura para artistas e coletivos de todo o estado.

Um dos projetos bauruenses aprovados no PROAC foi o Festival Multicultural Online Fuzuê na seção de Produção e realização de festival de cultura e economia criativa com apresentação online. Para Tiago Rosa, um dos co-fundadores do projeto, as aprovações de grupos e de trabalhadores da cultura nos editais estaduais trarão um impacto social e financeiro grande para a cidade, possibilitando diversas manifestações culturais diferentes na cidade.

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