Parado há 5 anos, plano de mobilidade fica indefinido no governo Suéllen
Falta de estruturas afeta quem opta por se locomover de bicicleta; questão não progride na cidade desde o decreto de 2017
Publicado em 6 de maio de 2021
Por Andrezza Marques e Marcela Franco
“Eu costumo sair com alguns minutos de antecedência. Em muitos momentos, eu desço da bike para atravessar algumas ruas importantes”, conta Paula Machado, produtora de artes visuais, que utiliza a bicicleta para se locomover em Bauru há dez anos. Na época em que adotou esse meio de transporte, ela era estudante e o que a motivou foi a economia: “eu achava um desperdício de tempo e de dinheiro, trechos curtos de deslocamento serem tão caros e demorarem tanto com o ônibus”.
Para Fábio Silva, membro do coletivo Pedala Bauru, o cenário bauruense é parecido com a maioria das cidades do país. “Realidade triste de se constatar”, comenta, sobre a ausência de estruturas cicloviárias.
“Do ponto de vista prático faltam estruturas exclusivas e incentivadoras do uso da bicicleta, como ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas, sinalização, locais para estacionar e aguardar, pontos de descanso, iluminação, arborização, sinalização, manutenção e conexão entre as estruturas existentes”, comenta Fábio.
Violência e falta de respeito no trânsito, sobretudo por parte de usuários de meios de transporte motorizados, como carros e motocicletas, são também exemplos citados por Fábio para ilustrar a ausência de condições favoráveis ao deslocamento de ciclistas na cidade.
Bauru conta com 16 estruturas destinadas para ciclistas, que somadas totalizam cerca de 32 quilômetros.
As estruturas possuem características que as diferem. Nas ciclovias, por exemplo, ocorre uma separação física entre as bicicletas, os carros e as motos, e as pistas são destinadas exclusivamente para a circulação de ciclistas.
São as ciclovias da Av. Edmundo Coube de 1.100m, a do Distrito I ao Núcleo Octávio Rasi com uma extensão de 1.600m e a maior delas, a da Av. Nações Norte de 7.000m.
Em ciclofaixas, a pista em que os veículos e as bicicletas circulam é a mesma, mas há a separação dos espaços exclusivos para os ciclistas pela pintura do solo.
Essas estruturas estão em maior número na cidade: Av. Moussa Tobias com 1.100m, Av. Comendador José da Silva Martha de 4.500m, Av. Dr. Mário Oliveira Mattosinhos de 600m, Av. Maria Ranieri de 1.100m, Av. Nuno de Assis de 1.600m e Av. Jorge Zaiden com 1.200m de pista sinalizada.
As ciclorrotas constituem estruturas mais simples: são vias como ruas e avenidas que partilham o fluxo de transportes motorizados com as bicicletas, e costumam apresentar um movimento menor de veículos. Em Bauru, as rotas são sinalizadas pela pintura de um círculo com o desenho de uma bicicleta no solo para indicar a preferência dos ciclistas.
Elas ficam ficam localizadas na Rua Aviador Gomes Ribeiro entre as ruas Rubens Arruda e Prof. José Ranieri com uma extensão de 1.300m, na Rua Sete de Setembro entre as ruas Araújo Leite e Pedro de Toledo de 1.300m, na Rua Gerson França, entre as ruas Primeiro de Agosto até Comendador José da Silva Martha de 1.900m e na Rua José Fernandes, entre as ruas Comendador José da Silva Martha e Capitão Gomes Duarte de 450m.
Já na ciclofaixa de lazer, uma faixa da pista é reservada em um horário e dia específico para os ciclistas circularem. A separação costuma ser complementada por cones.
As ciclofaixas de lazer na cidade estão localizadas na Av. Getulio Vargas, com uma extensão de 2.000m e na Av. Marcos de Paula Rafael de 1.300m.
Segundo o presidente do Conselho Municipal de Mobilidade, para entender a qualidade desses trechos é preciso ir além da extensão. João Felipe Lança explica que uma estrutura cicloviária pode ter redes extensas, mas com poucos trechos em área urbana e sem ligações entre bairros, o que reduz a possibilidade de deslocamento de ciclistas. “A avenida Nações Unidas Norte, por exemplo, conta sete quilômetros de ciclovia, mas ela não tem ligação importante”, afirma.
Para se locomover nos principais trechos da cidade, a solução da ciclista Paula é evitar ruas com grande fluxo de carros e horários de pico. “Eu evito pedalar em avenidas muito movimentadas”, conta.
Neuza Arakaki, integrante do Coletivo Pedala Bauru, conta que quase foi atropelada quando andava de bicicleta na cidade. Desde então, passou a usar a bicicleta apenas para fazer trilhas. Para ela, o tráfego de Bauru é intenso e faltam ciclovias.
De acordo com boletim do Instituto de Pesquisa de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), plataforma que monitora a mobilidade urbana em diversas regiões do país, as condições de segurança no trânsito são fatores que desestimulam muitas pessoas a usarem a bicicleta como meio de transporte nas cidades brasileiras.
O informe indica que o uso de bicicleta representa no máximo 3% dos deslocamentos diários. A baixa abrangência da infraestrutura cicloviária é um dos principais fatores que torna o uso da bicicleta menos atrativo, uma vez que mais de 80% da população das 27 capitais brasileiras vivem a mais de 300 metros de uma ciclovia, ciclofaixa e ciclorrota.
Ciclovias e ciclofaixas não são implementadas em Bauru
Nomeado pelo Decreto Municipal nº 13.417 de 1 de Junho de 2017, durante a gestão de Clodoaldo Gazzetta (PSDB), o Plano de Mobilidade de Bauru prevê melhorias no sistema viário e de transporte da cidade, priorizando os meios não motorizados e/ou coletivos, como as bicicletas e os ônibus.
O ponto chave do Plano é a mobilidade ativa, ou seja, quando as pessoas caminham ou pedalam, para se deslocar de um ponto a outro. Tópicos como acessibilidade e ações nas áreas de educação, meio ambiente e saúde também são abordados no documento.
De acordo com Gazzetta em entrevista ao Jornal Dois, seu plano de governo tinha como diretriz a construção de 32 quilômetros de ciclovia até o fim do mandato, mas a única ação implementada foi a ciclofaixa da avenida Nuno de Assis.
Segundo o ex-prefeito, um conjunto de obras estava encaminhado para o final de 2019 e começo de 2020, mas os recursos tiveram que ser realocados devido à pandemia do novo coronavírus. “Tinha sobrado um pouco mais de R$ 4,5 milhões que seriam utilizados para construção das ciclovias. Não foi possível a conclusão por conta da pandemia”, afirmou.
Para João Lança, a pandemia não pode ser uma desculpa para que iniciativas de baixo custo não tenham sido tomadas.
“A gente viu diversos municípios que nesse momento melhoraram as questões de mobilidade com a ampliação de pistas e outras estruturas, que é algo extremamente barato para poder combater até a questão do coronavírus. Isso a gente viu muito pouco do governo municipal”.
Durante a pandemia, Belo Horizonte ampliou a estrutura para bicicletas circularem. Foram 30 quilômetros de extensão de ciclovias ligando trechos já existentes das regiões da cidade, feitos com pintura no chão, cones e faixas no local. Sorocaba também recebeu melhorias em trecho de ciclovia em 2021.
O presidente do conselho ainda destaca que não são necessários grandes investimentos de recursos para implementar estruturas voltadas para ciclistas. “Pintar uma ciclofaixa é algo extremamente barato, as prefeituras gastam muito mais com sinalização exclusiva para automóvel de uma grande avenida”.
Para João, mudanças na estrutura voltada para o uso de bicicletas podem ser feitas sem estarem ligadas a grandes empreendimentos.“O governo estava muito mais preocupado em direcionar recursos de grandes obras e deixou de fazer pequenas intervenções, como pintar algumas ciclofaixas, por exemplo”.
Como fica o Plano?
A gestão da prefeita Suéllen Rosim (Patriota), não trouxe mudanças no texto do decreto e também não propôs nenhum projeto para as estruturas cicloviárias, como ciclofaixas e ciclovias.
Na campanha eleitoral, as promessas em relação à mobilidade urbana enfatizavam pavimentação e revitalização de asfaltos na cidade. João Felipe Lança avalia que existe pouca preocupação da prefeitura com a mobilidade ativa.
“Com toda a mudança de composição da Câmara Municipal, vimos um certo retrocesso. A prefeitura voltou a discutir questões do sistema viário que não fazem menção ao pedestre, que não se importam tanto com o transporte público e com o sistema cicloviário”, diz Lança sobre a participação do conselho em audiência pública em 16 de março de 2021.
A implementação das ações do Plano deve partir inteiramente do poder executivo, sendo a própria prefeitura e as secretarias de Planejamento e Obras responsáveis por progredir com o decreto.
A função do conselho é promover uma participação ativa da população nas decisões e criações de políticas públicas, e segundo Lança, fiscalizar as ações e cobrá-las do poder público em caso de inércia. Essa fiscalização foi comprometida pela pandemia, já que os membros do conselho vêm enfrentando dificuldades para reunião e deliberação de pautas, relata João Felipe.
“No ano passado, quando ainda funcionavam as atividades presenciais do conselho, enviamos uma série de ofícios para a prefeitura cobrando ações, como a instituição de um fundo e para que se realizasse a conferência a cada dois anos. Mas a gente teve resposta de muito pouco. E entendemos que, muito em função da quarentena, não avançamos tanto quanto deveríamos”.
As reuniões que já não ocorriam de maneira presencial desde 2020, também não estão sendo realizadas on-line, pois muitos membros não têm condições de participar por falta de estrutura e facilidade com o meio digital, segundo João.
Captação de recursos
A captação de recursos para obras de mobilidade ocorre por meio de editais ou emendas parlamentares. A captação de recursos é a forma da prefeitura conseguir financiamento para realizar a implementação das obras na cidade.
Como o plano de mobilidade de Bauru já foi elaborado, o ex-prefeito comenta que para participar de algum programa do governo, seria preciso vinculá-lo aos projetos básico e executivo. O primeiro é o conjunto de documentos que devem seguir algumas exigências para viabilizar a obra. O segundo detalha todas as informações técnicas necessárias para realizar o empreendimento.
Na visão de Lança, também seria importante transformar o plano em um projeto de lei, e não mantê-lo apenas como decreto. “Desde 2017, a gente já dizia que o decreto não tem força de lei, e isso o deixa um tanto quanto à mercê do gestor que ocupa o cargo. Se a prefeito quiser, ela consegue mudar”, comenta o presidente do Conselho Municipal.
O texto do decreto pode ser alterado por qualquer chefe do executivo, como o prefeito ou o presidente. Já o projeto de lei precisa prosseguir por parlamentares do legislativo, como vereadores, deputados e senadores, até ser sancionado pelo presidente. Se o projeto virar lei, passa a ter mais força que o decreto, já que apenas a lei pode obrigar, desobrigar ou proibir, segundo a Constituição.
Questionada pelo Jornal Dois sobre a implementação do plano, a prefeitura afirmou que está dando sequência, sem informar como nem quando as obras serão implementadas.
A nova gestão afirma que a Seplan tem exigido ciclovias como parte das diretrizes para a execução de novos empreendimentos de grande porte como medida de melhoria da infraestrutura e políticas de conscientização para a segurança dos ciclistas bauruenses.
Importância da bicicleta para a cidade
A captação de recursos para obras de mobilidade ocorre por meio de editais ou emendas parlamentares. A captação de recursos é a forma da prefeitura conseguir financiamento para realizar a implementação das obras na cidade.
Como o plano de mobilidade de Bauru já foi elaborado, o ex-prefeito comenta que para participar de algum programa do governo, seria preciso vinculá-lo aos projetos básico e executivo. O primeiro é o conjunto de documentos que devem seguir algumas exigências para viabilizar a obra. O segundo detalha todas as informações técnicas necessárias para realizar o empreendimento.
Na visão de Lança, também seria importante transformar o plano em um projeto de lei, e não mantê-lo apenas como decreto. “Desde 2017, a gente já dizia que o decreto não tem força de lei, e isso o deixa um tanto quanto à mercê do gestor que ocupa o cargo. Se a prefeito quiser, ela consegue mudar”, comenta o presidente do Conselho Municipal.
O texto do decreto pode ser alterado por qualquer chefe do executivo, como o prefeito ou o presidente a nível nacional. Já o projeto de lei precisa prosseguir por parlamentares do legislativo, como vereadores, deputados e senadores, até ser sancionado pelo presidente. Se o projeto virar lei, passa a ter mais força que o decreto, já que apenas a lei pode obrigar, desobrigar ou proibir, segundo a Constituição.
Questionada pelo Jornal Dois sobre a implementação do plano, a prefeitura afirmou que está dando sequência, sem informar como nem quando as obras serão implementadas.
A nova gestão afirma que a Seplan tem exigido ciclovias como parte das diretrizes para a execução de novos empreendimentos de grande porte como medida de melhoria da infraestrutura e políticas de conscientização para a segurança dos ciclistas bauruenses.
Quer começar a usar a bicicleta para se locomover? Confira as dicas que o ciclista Fábio compartilhou com o Jornal Dois:
- Saiba se portar bem nas vias. Nunca ande junto do meio fio ou guia, procure ocupar a faixa da direita, pedalando numa distância lateral de uns 50 cm ou mais da guia.
- Sempre faça contato visual com motoristas e sinalize seus movimentos no trânsito, como quando vai virar para algum lado.
- O melhor caminho para ir de bicicleta nem sempre é o mesmo que você faria com um veículo motorizado, então pense em ir pelas ruas mais tranquilas e arborizadas, por dentro dos bairros.
- Respeite muito os pedestres e também outros ciclistas.