Contra aulas presenciais na pandemia, servidores municipais paralisam em Bauru
Mobilização da Educação reivindica condições seguras de trabalho e vacinação prioritária aos profissionais da rede municipal de ensino
Publicado em 4 de março de 2021
Por Michel F. Amâncio
Edição Camila Araujo
Em assembleia realizada na noite do dia 25 de fevereiro, uma quinta-feira, trabalhadores do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Bauru e Região (Sinserm) iniciaram uma greve sanitária na cidade.
O movimento reivindica que sejam oferecidas condições seguras para o retorno das atividades presenciais nas escolas, com a vacinação de todos os profissionais da educação, entre professores e equipe de apoio.
Em 26 de fevereiro, uma comissão de greve foi formada, responsável por planejar as próximas ações do movimento. Melissa Lamonica, diretora do Sinserm, contou ao Jornal Dois que existe uma dificuldade em planejar ações de mobilização por conta da pandemia. Mas, ela diz que não descarta a possibilidade de realizar atos simbólicos, como carreatas, enquanto durar o movimento.
A Prefeitura de Bauru decidiu retomar as aulas presenciais na última segunda-feira (1), com ocupação de até 25% do total de estudantes em cada turma. A medida foi autorizada por decreto publicado no Diário Oficial em 21 de janeiro. A Secretaria de Educação havia definido o início do período letivo de forma remota entre os dias 10 e 26 de fevereiro.
A rede municipal possui 90 escolas: 65 de educação infantil, 16 de ensino fundamental e nove de jovens e adultos.
De acordo com a prefeitura, três ainda não retomaram as atividades, todas do ensino fundamental – a Dirce Boemer Guedes de Azevedo, no Parque Bauru, a Maria Chaparro Costa, no Parque Santa Edwirges, e a Cônego Aníbal Difrância, no Parque São Geraldo.
Adesão e represálias
Melissa Lamonica declarou que a adesão ao movimento foi fraca no primeiro dia de paralisação. Depois, segundo ela, o número de trabalhadores paralisados aumentou, chegando a cerca de 100 servidores.
Para Iara Costa, servidora municipal que atua no Ensino Fundamental em Bauru, a baixa adesão está relacionada ao desgaste da pandemia. Ela sustenta que a “coerção sofrida por supervisores e diretores” influencia na decisão de não paralisar. “Sofremos ameaças, muitos dos servidores de apoio não conseguem desempenhar as funções de forma remota e temem pela perda de salário sobre os dias não trabalhados”.
Melissa disse que essa pressão por parte da prefeitura já era esperada.
Uma funcionária da rede pública de ensino, que não aderiu à greve e preferiu não se identificar, contou que “o álcool em gel não está disponível nas salas de aula, e a gente tem que ficar pedindo porque se não a direção não entrega”. Segundo ela, não está havendo medição da temperatura dos professores e “o termômetro marca sempre 31 graus nas crianças, que continuam entrando”.
Ela disse que uma funcionária da equipe de apoio da escola em que trabalha teve Covid-19 e voltou ao trabalho “normalmente”, mesmo não se sentindo bem.
Em nota, a Prefeitura de Bauru disse que “todos os equipamentos de proteção individual (EPIs) estavam nas escolas para a volta das aulas, como totens de álcool gel, máscara, ‘face shield’, além do reforço na higienização dos espaços e demarcação na parte externa para que pais e alunos mantenham o distanciamento na entrada e saída dos estudantes”.
Declarou também que “o primeiro dia de aula teve todas as escolas aptas funcionando normalmente” e que foi registrado 20 ausências de servidores, sendo 15 professores – 11 do ensino fundamental e quatro do infantil, e cinco servidores de apoio – sendo um do fundamental e quatro do infantil.
Em outro posicionamento, solicitado pela reportagem, a municipalidade pontuou que “respeita o direito de greve dos servidores, contudo destaca que foram observadas todas as determinações do protocolo de biossegurança para a retomada das aulas”.
Protocolos
Iara explicou ao Jornal Dois que decidiu paralisar e permanecer em trabalho remoto porque “as escolas não foram preparadas adequadamente para um retorno responsável”.
Para a servidora, a inspeção realizada pelo poder público é insuficiente. “Tivemos uma inspeção feita por pessoas que não são técnicas na área, com uma prancheta e um questionário assinalando o que tinha ou não nas escolas”, afirmou.
Perguntada sobre qual a reação de pais de alunos ao saber que parte dos servidores entrariam em greve, Iara contou que alguns ficaram frustrados. Mas que, ao explicar os termos dos protocolos, eles concordaram em continuar remotamente.
“Faltou formação para os servidores, de como agir e proceder nesta situação que é nova para todos”, disse.
Possíveis negociações
Embora não exista um canal de negociação com o executivo municipal, segundo a diretora do Sinserm, há um contato permanente com a Secretaria de Educação. “Mas não são eles que mandam, então não adianta muita coisa”, afirmou a servidora. De acordo com ela, o sindicato tem pressionado a Câmara Municipal para que “ocorra logo a vacinação dos servidores da pasta”.
Em live no Facebook, José Francisco Martins, advogado do Sinserm, disse que o sindicato já encaminhou um ofício à prefeita Suéllen Rosim (Patriota), e à secretaria de educação Maria do Carmo Kobayashi com objetivo de abrir uma mesa de negociação entre o sindicato, a comissão de greve e a Prefeitura de Bauru.
O que significa “greve sanitária”
“Greve sanitária” ocorre quando trabalhadores são submetidos a situações de insegurança no ambiente de trabalho. O advogado José Francisco explicou que se trata de um subtipo da greve comum, reconhecida na Constituição do Estado de São Paulo na forma de greve ambiental.
Martins comentou que outras situações podem levar trabalhadores a aderirem à greve sanitária: “trabalhadores de uma indústria química, por exemplo, em um local onde ocorre um vazamento”. Nesse contexto, segundo ele, não existe condição segura para trabalhar.
“O risco de contaminação no ambiente escolar de trabalho é o principal argumento dos servidores municipais que aderiram à greve”, afirma.
Mesma reivindicação
Os servidores da rede estadual da Educação também estão em greve, iniciada em 8 de fevereiro. O movimento das duas redes de ensino tem como pauta única a “greve pela vida”, e colocam que docentes e funcionários de escolas devem estar no grupo prioritário da vacinação contra o novo coronavírus.