Usar verba de Fundos Municipais para pandemia em Bauru não é defender a vida
Câmara Municipal adiou ontem (15) votação de Projeto de Lei em que o prefeito Gazzetta solicita uso dos Fundos Municipais em despesas de combate ao coronavírus
Publicado em 16 de abril de 2020
Por Jéssica Batista, colunista do J2
Defender o isolamento social não basta, é preciso defender a vida. E utilizar as verbas dos Fundos Municipais de Direitos não é uma política de defesa à vida!
O combate à pandemia da covid-19 deve ser tratado no âmbito da saúde pública, que obviamente, não se restringe à quantidade de leitos hospitalares, testes e profissionais de saúde.
A saúde pública abrange as necessidades sociais de saúde, ou seja, são conhecimentos e práticas utilizados para assegurar as condições de sustentação da vida humana.
Quem são as pessoas mais suscetíveis ao contágio com o coronavírus? Aquelas que antes de pensarem no isolamento social, ou na higienização das mãos, ou no uso de máscaras, ou na alimentação saudável, ou do não compartilhamento de objetos de uso pessoal, estão tentando manter-se vivas.
É a classe trabalhadora, os trabalhadores do comércio com o risco do fim do isolamento social, os/as motoristas de ônibus, os/as terceirizados/as, os/as trabalhadores/as informais. Em especial, as pessoas em situações de vulnerabilidade como as mulheres, crianças e idosos em situação de violência doméstica, os sem-teto, crianças e adolescentes acolhidos, famílias sem renda, pessoas que dependem do direito às Políticas Públicas Sociais.
Acontece que muitas dessas políticas públicas vêm dos Fundos Municipais.
Diante deste cenário, os vereadores bauruenses propuseram mudar o destino das verbas que são destinadas aos fundos públicos, como o de Direito da Criança e do Adolescente, da Habitação, da Assistência Social, o da Pessoa Idosa, o do Meio Ambiente, entre outros.
O primeiro requerimento considerou as emendas ilegais e inconstitucionais. Três delas, são de autoria dos vereadores Benedito Meira (PSL) e Mané Losila (MDB).
A primeira estabelecia que só seriam utilizados recursos se comprovado o emprego da totalidade de verbas oriundas de transferências extraordinárias da União, do Estado ou outras fontes. Até agora, o município recebeu R$ 8,1 milhões, dos quais apenas R$ 860 mil foram gastos.
A segunda emenda dos vereadores propunha que, se necessárias as retiradas dos Fundos Municipais, que fossem feitas de maneira proporcional ao saldo financeiro de cada um deles. E a terceira emenda incluía na lei uma tabela com os valores referentes ao superávit de cada um dos fundos até 2019 – bem como previsão de arrecadação para 2020, que totalizam, respectivamente, R$ 22,4 milhões e R$ 4,5 milhões.
E a última emenda foi apresentada a pedido do Ministério Público do Trabalho por José Roberto Segalla, vereador presidente da Casa. O intuito era evitar o uso de recursos destinados aos fundos por decisões judiciais.
Agora, o prefeito Clodoaldo Gazzetta (PSDB) transformou essas emendas em Projeto de Lei (Processo 69/20) destinado ao enfrentamento ao novo coronavírus.
Com isso, fica evidente que não se trata de uma política de combate à covid-19, mas uma medida que agravará as condições de vida das pessoas mais vulneráveis às necessidades sociais de saúde.
Se antes da epidemia muitas dessas políticas públicas já estavam comprometidas com a acentuação da terceirização dos serviços públicos, ou com a Emenda Constitucional que limita por 20 anos os investimentos públicos, agora a precarização das condições de vida da população mais pobre e periférica da cidade de Bauru está caminhando a passos largos.
Vale ponderar que os Conselhos Municipais, que regulamentam a destinação dos recursos da maioria dos fundos municipais, são questionáveis.
Historicamente, a criação dos Conselhos Municipais foi um importante instrumento de democratização das políticas públicas, mas ao longo dos anos tornou-se um espaço de grandes disputas políticas e econômicas, principalmente com a apropriação, pelo terceiro setor, das políticas sociais.
Mesmo com essas contradições, os Conselhos Municipais ainda são instrumentos de disputas. Foram conquistados pelas lutas por Direitos Humanos e podem cumprir com sua função social de proteção e garantia de direitos.
O prefeito e os vereadores não estão longe da necropolítica de Bolsonaro. Enquanto uns tiram verbas das Políticas Públicas Sociais, o outro destina R$1,2 trilhões aos bancos.
Quem ousa defender a vida em tempos de pandemia deve impreterivelmente promover medidas de defesa, em primeiro lugar, à saúde pública e ao SUS.
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