Exclusivo: 187 servidores públicos em Bauru receberam auxílio emergencial sem ter direito
Benefício foi criado pelo Governo Federal para proteger desempregados, trabalhadores informais, microempreendedores individuais e autônomos dos efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus
Publicado em 16 de julho de 2020
Por Lucas Mendes e Daniel Kojima (processamento de dados)
187 funcionários públicos da cidade de Bauru receberam o auxílio emergencial no mês de maio sem ter esse direito. O número foi revelado pela Controladoria Geral da União (CGU) ao Jornal Dois.
Voltado a desempregados, trabalhadores informais (sem carteira assinada), microempreendedores individuais (MEIs) e pessoas em situação de vulnerabilidade social, o benefício do auxílio emergencial começou a ser pago em abril como forma de garantia de renda a essas pessoas durante o período de quarentena e isolamento social em combate ao coronavírus.
Um levantamento feito pela CGU identificou que 396.316 servidores públicos de todo Brasil receberam o dinheiro do auxílio, nas esferas federal, estadual e municipal. No estado de São Paulo, em parceria com o Tribunal de Contas do Estado (TCE), foram descobertos 8.973 pagamentos a servidores do Governo de São Paulo e das prefeituras municipais no mês de maio.
Na Prefeitura de Bauru
Cruzamento de dados feito com exclusividade pelo Jornal Dois apontou que, para o mês de maio, nomes de 81 funcionários da Prefeitura Municipal de Bauru aparecem na lista de beneficiários do auxílio emergencial na cidade.
A correspondência nos nomes não é o bastante para afirmar que esses servidores municipais receberam o dinheiro, pois pode se referir a casos de pessoas que tenham o mesmo nome. O número, no entanto, está dentro do total de 187 pagamentos irregulares a funcionários públicos em Bauru, revelado pela CGU, englobando servidores da prefeitura e do governo estadual.
Também pode ter ocorrido a inclusão automática do nome do servidor entre os beneficiários do auxílio, sem a necessidade de ter feito o pedido. Isso é possível nos casos em que servidores públicos estejam no Cadastro Único para programas sociais ou que sejam beneficiários do Programa Bolsa Família. A CGU ainda faz a ressalva de que o CPF do servidor pode ter sido inserido por outra pessoa de forma indevida.
Em Bauru, 61.714 pessoas receberam o auxílio em abril. Em maio foram 10.489 beneficiados com o pagamento, de acordo com o Portal da Transparência do Governo Federal. O valor total pago a bauruenses nos dois meses superou os 50 milhões de reais.
Proteção aos mais vulneráveis
O auxílio emergencial foi planejado para oferecer uma proteção financeira às pessoas em situação de pobreza e vulnerabilidade social e àqueles que trabalham por conta própria e não podem trabalhar de casa.
O projeto inicial do governo Jair Bolsonaro (sem partido) indicava o pagamento de 200 reais. A proposta subiu para o valor atual de 600 reais por três meses, depois de discutida no Congresso Nacional. O valor chega a 1.200 reais no caso de mães solteiras.
Pessoas que recebem o Bolsa Família ou que estão inscritas no Cadastro Único também podem receber o auxílio.
O governo Bolsonaro sancionou, no final de maio, uma lei de ajuda financeira a estados e municípios com previsão de que os governos locais congelassem salários e contratações de novos funcionários.
No final de junho o Governo Federal anunciou a prorrogação do auxílio por mais dois meses. Segundo a Caixa Econômica Federal, 64,5 milhões de brasileiros foram beneficiados pelo auxílio emergencial até o momento, num total de 103,8 bilhões de reais destinados pelo programa.
Quem são os servidores?
São cerca de 11,4 milhões os brasileiros que trabalham como funcionários públicos. A maioria deles está em áreas de prestação de serviços – 44% de todos os servidores atuam em educação, saúde, limpeza ou segurança.
Metade dos funcionários públicos no país ganha até 2.700 reais por mês. Servidores federais ganham mais que os estaduais que ganham mais que os municipais. Os dados são do Atlas do Estado Brasileiro, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
Existe uma desigualdade de remunerações no setor público. Em média, varredores de rua ganham 1.600 reais por mês. Professores de 1˚ a 4˚ série, com nível superior, recebem 3.300 reais mensais, também na média. Carreiras como as de juiz e desembargador podem receber o teto do funcionalismo público – o equivalente ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), de 39.200 reais. Existem casos de pagamentos irregulares de “supersalários” aos servidores da elite do funcionalismo, que ultrapassam o valor do teto salarial estabelecido em lei.
Posição dos governos
A Prefeitura de Bauru afirmou, por meio de nota à reportagem, que não recebeu nenhum ofício do Ministério Público sobre eventual pagamento irregular do auxílio emergencial a servidores municipais e que não tem conhecimento dos nomes dos servidores que receberam o benefício. A nota indica que a prefeitura vai elaborar um informativo com as regras do auxílio emergencial para os servidores municipais.
Já o Governo de São Paulo, também por meio de nota, informa que a Corregedoria Geral da Administração já instaurou expediente, no dia 19 de junho, para apurar os supostos pagamentos irregulares a servidores estaduais.O governo “determinou expedição de ofício ao TCE solicitando acesso à lista dos servidores que, supostamente, teriam recebido de forma indevida o auxílio emergencial do Governo Federal”.
De acordo com a CGU o servidor público que tenha recebido pagamento indevido pode providenciar a devolução do dinheiro, por meio do site http://devolucaoauxilioemergencial.cidadania.gov.br.
É preciso inserir o CPF e escolher uma das opções para devolver o benefício: gerar uma Guia de Recolhimento da União (GRU), que pode ser paga no Banco do Brasil, ou uma que pode ser recebida em toda a rede bancária.