Em quatro meses, 0,15% dos presos de Bauru foram testados para covid-19

Testagem foi aplicada em dez das mais de 6 mil de pessoas presas nas quatro unidades prisionais da cidade; surto de coronavírus em  presídios pode sobrecarregar serviço municipal de saúde

Publicado em 23 de julho de 2020

Sem os testes é impossível saber como está a pandemia dentro das unidades prisionais (Colagem: Letícia Sartori / Jornal Dois)
Por Lucas Mendes

Dez presos que cumprem pena em Bauru passaram por testes para detectar o novo coronavírus até o momento. A quantidade equivale a 0,15% da população carcerária da cidade, que abriga 6455 pessoas em quatro unidades prisionais. Entre os servidores que trabalham no sistema prisional em Bauru 23 foram testados.

A informação foi repassada ao Jornal Dois na terça-feira (21) pela Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), do Governo de São Paulo. 

Bauru registrou o primeiro caso positivo da doença há 114 dias, em 30 de março. Até o final da noite de quarta-feira, 22 de julho, eram 3204 casos confirmados e 60 mortes por coronavírus na cidade desde o início da pandemia. 

O boletim mais recente divulgado pela SAP, de terça-feira, apontava que 791 servidores e 1664 presos testaram positivo para coronavírus no estado de São Paulo. Os casos foram confirmados por meio de teste laboratorial (RT-PCR) e teste rápido (IgM/IgG). Até o momento 20 servidores e 17 presos morreram pela covid-19 em São Paulo.

Números oficiais da SAP podem indicar subnotificação de casos, devido à baixa testagem (Arte: Lucas Mendes / Jornal Dois)

O baixo número de testes preocupa profissionais que atuam no sistema penitenciário ouvidos pela reportagem. Sem os testes é impossível saber como está a pandemia dentro das unidades prisionais, o que impede a tomada de ações de prevenção, como o isolamento de presos e o afastamento de servidores contaminados.

“A SAP infelizmente está sendo omissa”, afirma Carlos Eduardo Piotto, policial penal e diretor jurídico do SINDCOP (Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária de São Paulo). 

De acordo com o servidor, algumas prefeituras no Estado conseguiram viabilizar a realização de testes nos presos e servidores. “Acredito que não seria obrigação das prefeituras [fazer testes para coronavírus entre os presos], porque elas não têm o orçamento que o Governo do Estado tem. Mas se tiver um surto dentro de uma unidade prisional, isso vai sobrecarregar os municípios, porque os presos têm que ser atendidos na cidade, além dos próprios funcionários”.  

Sobrecarga nos leitos 

Em caso de necessidade de internação hospitalar, os presos devem ser atendidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) nos municípios. Em situações de casos graves de covid-19 isso aumentaria a pressão por leitos de enfermaria e de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). 

Desde o início de julho em Bauru a ocupação dos 56 leitos de UTI para pacientes graves de covid-19 está acima de 80%. 

A procura por leitos pode ser maior se considerada a população carcerária de cidades da região, como Pirajuí, Balbinos e Reginópolis que, em caso de necessidade de internação em UTI, viriam para Bauru.

Prefeituras da região metropolitana de São Paulo desenvolvem ações de prevenção ao coronavírus dentro dos presídios. Na foto, profissional da Prefeitura de Guarulhos auxilia na higienização da Penitenciária Adriano Marrey (Foto: Reprodução/SAP)

Ao todo a região abriga 14.416 pessoas presas. Todas as unidades prisionais dessas quatro cidades têm lotação acima da capacidade, com exceção do CPP 3 de Bauru (Centro de Progressão Penitenciária), que teve parte da estrutura destruída após incêndio causado por motim de reeducandos em janeiro de 2017.

Contaminação nos presídios

A aglomeração de pessoas, intensificada pela superlotação das unidades prisionais, torna esses ambientes sujeitos à proliferação de doenças infecto contagiosas, como a covid-19. 

Para se ter uma ideia do nível de propagação de doenças no sistema prisional, a tuberculose atinge 33 pessoas para cada 100 mil brasileiros. Entre os detentos, a proporção é de 932 casos para cada grupo de 100 mil, segundo dados de 2015 do Ministério da Saúde. 

Conforme relata Leonardo Biagioni de Lima, defensor público e coordenador-auxiliar do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, nenhuma das 176 unidades prisionais do estado conta com equipe mínima de saúde e 71% têm racionamento de água.

Para o defensor, a ausência de testes impede a compreensão do cenário real.

“Isso ficou evidente na testagem em massa feita na Penitenciária 2 de Sorocaba, onde cerca de 34% da população carcerária testou positivo para coronavírus”, pontua. 

Testagem em massa

Até o fechamento da reportagem a Prefeitura de Bauru não respondeu ao Jornal Dois se pretende fazer alguma ação de testagem nas unidades prisionais de Bauru ou se existem protocolos para o caso de um possível surto de coronavírus nas unidades prisionais da cidade.

Por meio de nota à reportagem, a SAP informa que “no momento ainda não há data prevista para testagem em massa em Bauru, mas a unidade deverá ser contemplada no programa de testagem em massa do Governo de São Paulo em populações vulneráveis, incluindo-se aí, as pessoas privadas de liberdade”. 

A secretaria pontua que as unidades prisionais foram inseridas num cronograma técnico elaborado por órgãos de saúde, iniciativa conjunta das Secretarias da Administração Penitenciária, da Saúde e de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo, por meio do Instituto Butantan e do Centro Paula Souza.  

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