7 Leis (quase) inúteis na cidade de Bauru

Reunimos algumas leis que são difíceis de fiscalizar e acabam se tornando impraticáveis

Reportagem publicada em 1 de agosto de 2018

Todas as leis municipais podem ser consultadas no site da Câmara Municipal, na área de pesquisa (imagem reprodução redes sociais)


Por Lorenzo Santiago


A Câmara Municipal de Bauru tem como função criar leis que regulamentem a vida em sociedade, sejam elas relativas ao trânsito, saúde, educação e limpeza de locais públicos.

Toda lei tem a sua importância, e surge de demandas da cidade e dos munícipes. Mas se o poder público não consegue fiscalizar, as normas e regras municipais se tornam quase que inúteis.

Neste aniversário de 122 anos de Bauru, listamos algumas leis que, mesmo em vigor, são ineficazes e impraticáveis.

Lixo no chão

Para a manutenção da limpeza dos locais públicos é importante que o munícipe não jogue lixo no chão, seja ele qual for. Além de deixar praças e parques com aparência suja, os resíduos sólidos como plásticos, papelões, papéis e metais obstruem as “bocas de lobo”, impedindo o escoamento da água em dias de chuva e favorecendo alagamentos nas vias públicas e residências.

Mas em Bauru existe uma lei que proíbe o cidadão de jogar lixo no chão em qualquer via pública (Lei 33.294/15). A proposta é boa, mas o problema está na fiscalização. A Secretaria do Meio Ambiente (SEMMA) possui 8 funcionários para realizar a fiscalização da limpeza pública. Considerando que eles não estão na rua o dia todo e que são quase 370 mil habitantes para os 8 funcionários, é quase impossível punir.

Os Policiais Militares podem realizar este tipo de autuação, mas eles não são os responsáveis por essa fiscalização. A função do policial militar, segundo o Procedimento Operacional Padrão da PM/SP, é manter a ordem pública, sem qualquer determinação para a limpeza dos locais públicos. Dessa forma, há três anos, não há um registro de um cidadão que tenha pago a multa de R$ 80,00 pela infração.

A situação se agrava com o perceptível baixo número de lixeiras nas ruas da cidade. No centro, por exemplo, há disposição de cestos de lixo no calçadão da Batista e na Praça Rui Barbosa, sem lixeiras disponíveis nas adjacências.

O mesmo serve para a deposição de lixos em terrenos baldios. São 30 mil terrenos sem construção para os mesmos 8 funcionários. Com isso, é quase ínfima a chance de um servidor público autuar em flagrante alguém depositando lixo nestes espaços.

Moto táxi tem que fazer isso?

O transporte individual em motos (moto-táxi) tem uma regulamentação própria, que passa pelo cadastramento junto a EMDURB, curso preparatório e regularização da motocicleta. Mas, depois que o moto-táxi já pode circular, há outras exigências — algumas difíceis de serem cumpridas. Uma delas é a proibição de que o condutor transporte uma pessoa que “não tem condições de cuidar da própria segurança” (Lei 18420/00). A lei é imprecisa pois não detalha o que seria um passageiro incapaz de cuidar da própria segurança. Dessa forma, é quase impossível o motociclista não transportar uma pessoa se ela afirmar ter condições de ser transportada.

As sessões da Câmara Municipal de Bauru ocorrem ordinariamente às segundas feira (Imagem disponível no site da Câmara Municipal de Bauru)

Outra determinação para os moto-taxistas é o “fornecimento de touca higiênica descartável, com proteção facial, descartável, que será inutilizável ao final da viagem” (Lei 25.130/02). Nas últimas 5 viagens feitas pelo repórter em moto táxis legalizados na cidade, apenas 1 motorista ofereceu uma touca que não era descartável. A dificuldade de fiscalização se dá também pelo uso do próprio equipamento de segurança, o capacete, que impossibilita a visualização do fiscal de trânsito se há ou não uso da touca higiênica, ainda mais se ela é descartável. Só é possível identificar em caso de denúncia, ou em operações de comando da Polícia Militar.

Em nenhum dos 5 moto-táxis havia qualquer placa informativa sobre essa lei, o que a torna de difícil conhecimento público também.

Cardápios em braile

Esta lei é fundamental para a acessibilidade. “Toma obrigatória a utilização de cardápios escritos em braile em bares, restaurantes, lanchonetes, hotéis e similares” (Lei 16.5211/99). No Brasil são mais de 6 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência visual, e são 582 mil pessoas cegas — dados IBGE, de 2010. Nos últimos 8 estabelecimentos frequentados pelo repórter o cardápio padrão não tinha dispunha das opções em braile, e não havia um cardápio alternativo com esse sistemas de escrita.

Apesar da importância, a lei não determina quem deve realizar a fiscalização. Dessa forma, as entidades públicas que tem contato com os estabelecimentos podem se omitir dessa averiguação, por não terem essa responsabilidade atribuída. Portanto a punição pode ocorrer somente via denúncia.

Animais Ferozes

A Lei número 6.684 de 2015 dispõe sobre a “colocação de placas de advertência, em locais visíveis, nas residências e empresas que tenham animais ferozes”. No papel, a norma é relevante, mas alguns pontos tornam-na infiscalizável. A começar porque são milhares de imóveis a serem fiscalizados na cidade. Segundo, porque a lei não determina quem deve fazer essa fiscalização. E terceiro porque não está especificado o que são animais ferozes, sem ofertar parâmetros para o que é considerado animal feroz.

Fezes na rua

Uma lei relacionada a animais e a limpeza de locais público é a 6.685/2015. Nela, está determinado que é “obrigatório o recolhimento dos resíduos fecais de animais conduzidos em espaços públicos”. Outra norma que não especifica que órgão do poder público é responsável por punir esta infração, tornando-a uma lei inutilizada. A multa prevista está no valor de R$ 95,40.

Incentivo à bicicleta

Apesar de surpreendente para os ciclistas bauruenses, existe uma lei que “institui a política pública de incentivo ao uso da bicicleta na cidade de Bauru” (Lei 5.829/2009). A lei prevê uma série de políticas públicas para fomentar o uso do modal no município como a “implementação de infraestrutura cicloviária urbana, como ciclovias, ciclofaixas, faixas compartilhadas, bicicletários e sinalização específica” e a “integração da bicicleta ao sistema de transporte público existente”.

Quase 10 anos depois da implementação da lei, existem 11 quilômetros de ciclovias que não são conectadas entre si e que estão nas extremidades do município (Nações Norte, Unesp e Distrito Industrial I), além de ciclofaixas que percorrem quase 20 quilômetros. O problema é que muitas dessas ciclofaixas só funcionam aos domingos, sendo espaço de estacionamento de veículos durante a semana.

Outro aspecto ainda não cumprido da lei é que nenhum ônibus da cidade aceita o transporte de bicicletas.

Somente em 2017 começou a ser discutido a implementação de uma malha cicloviária efetiva na cidade, que ainda não saiu do papel.

Lanche oficial

Bauru é muito conhecida no Estado de São Paulo e no Brasil por causa do lanche que leva o nome da cidade. Mas a receita usada, na grande maioria das vezes, não é a original.

“Com o objetivo de manter inalterada a receita original do sanduíche Bauru” o Poder Executivo de Bauru aprovou em 1998 a Lei 4314/98 que determina a receita do lanche original e registra a história de sua criação além da maneira correta de se fazer o sanduíche.

O curioso é que a Lei não regulamenta nada, ela só diz o que é um bauru original, para que sejam registradas as receitas originais na cidade.

Lei do lanche oficial Bauru, que traz a receita e o modo de preparo (Reprodução redes sociais)